No dia 07/02/2022, a União opôs Embargos de Declaração contra acórdão do STF no RE 1063187, leading case do Tema 962. No RE, discute-se a constitucionalidade da incidência do IRPJ e da CSLL sobre o valor correspondente à aplicação da taxa Selic (juros de mora e correção monetária) sobre os créditos recuperados pelos contribuintes em repetição de indébito. Restou fixada a seguinte tese: “[é] inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário.”

A Taxa Selic representa a taxa básica de juros do Brasil e tem a função de corrigir monetariamente o valor da moeda e, simultaneamente, de indenizar o credor pelo atraso no pagamento. Por força do art. 39, §4º, da Lei nº 9.250/1995, esse é o índice de correção monetária e de juros aplicado aos indébitos tributários.

A PGFN sustenta, como já noticiado pelo CCBA, que a incidência de IRPJ/CSLL sobre a taxa Selic já foi julgada em sede de recursos repetitivos pelo STJ, em que a Corte decidiu que os juros moratórios incidentes na repetição de indébito tributário têm natureza de lucros cessantes (RESP 1138695, Tema 504/STJ e Tema 505/STJ). O contribuinte, em sede de contrarrazões, assevera que os juros moratórios têm a finalidade de recompor dano patrimonial. A natureza desses valores seria, portanto, indenizatória por dano emergente, não representando renda, acréscimo patrimonial ou lucro sujeito ao IRPJ ou à CSLL.

O voto condutor do relator, Min. Dias Toffoli, afirma que o STF já se manifestou pela não incidência do Imposto de Renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função, no RE 855091, leading case do Tema 808/STF. O Ministro também aponta que a materialidade tributável pelo IRPJ e pela CSLL está relacionada com o acréscimo patrimonial, o que presume ganhos e riquezas novas ao patrimônio do contribuinte. Por fim, pontua a natureza indenizatória de dano emergente e a natureza autônoma dos juros de mora legais em relação à verba em atraso (art. 16, § único, Lei nº 4506/1964), não representando incremento ao patrimônio, pois os juros de mora recompõem perdas. Os demais votos foram noticiados pelo CCBA.

Nas razões dos Embargos de Declaração, a União aponta a existência de omissão, obscuridade e contradição no acórdão que analisou o Tema 962/STF. Inicialmente, aponta que o tema afetado à repercussão geral era restrito ao IRPJ, mas a fundamentação do acórdão deu interpretação constitucional ao art. 3º, §1º, da Lei 7.713/1988, que versa exclusivamente sobre o IRPF. Com isso, a Fazenda Nacional requer que a contradição seja sanada para que a parte dispositiva da decisão esteja alinhada com a tese fixada, excluindo-se a menção ao art. 3º, §1º, da Lei 7.713/1988.

Em relação à omissão, a União aponta que o acórdão deixou de analisar a modulação de efeitos, cabível na hipótese de alteração jurisprudencial dominante. Argumenta que o posicionamento adotado pelo STF modificou o desenho jurisprudencial decorrente do entendimento do STJ, no sentido da legitimidade da incidência de IRPJ e CSLL sobre a taxa Selic na repetição de indébito, o que ensejaria a aplicação do disposto no art. 927, §3º, do CPC/2015. Requer que a proclamação de inconstitucionalidade não alcance os fatos geradores anteriores à finalização do julgamento de mérito do Tema 962/STF.

Por fim, a Fazenda Nacional argumenta a obscuridade do acórdão, que apresentaria argumentos amplos, permitindo o elastecimento do alcance da tese fixada para outros contextos: pedidos de restituição, de compensação, de levantamento do depósito judicial, além dos juros de mora em geral, inclusive aqueles pagos em decorrência do atraso no cumprimento de obrigações avençadas entre particulares.

Para o sócio do CCBA, Onofre Alves Batista Júnior, o pedido de modulação dos efeitos já era esperado: “O Tema 962/RG é um clássico caso de overruling, pois após a sedimentação da matéria no STJ, entendimento contrário foi assentado pelo STF. Trata-se de exemplo claro da dinamicidade da jurisprudência e das possibilidades dos contribuintes, mesmo em cenários de oportunidades aparentemente escassas.”

“É possível que o STF module os efeitos, considerando a existência de jurisprudência do STJ sobre o assunto, e defina a aplicação dos efeitos da decisão para um grupo limitado de situações. Recentemente, o STF modulou os efeitos do RE 714139, sobre outro assunto, de maneira bastante inovadora ao declarar uma norma inconstitucional e permitir a sua produção de efeitos a partir do exercício financeiro de 2024, por exemplo. Agora, nesse caso da Selic, o pedido da Fazenda é para que a modulação não alcance fatos geradores anteriores à finalização do julgamento de mérito do Tema 962. A pretensão do Fisco é evidentemente inconstitucional. Se a norma foi declarada inconstitucional, os efeitos da decisão deveriam ser reconhecidos de maneira ampla, em proteção dos direitos dos contribuintes.”