No dia 10/02/2022, foi publicado acórdão proferido pelo TJMG no incidente de resolução de demandas repetitivas no processo 1.0024.14.014689-5/003, no qual restou definida a responsabilidade do credor fiduciário quanto a multas de trânsito, diárias de estadia e demais taxas e encargos originados com a apreensão de veículo automotor alienado fiduciariamente.

Foi fixada a seguinte tese: “Compete ao devedor fiduciante o pagamento dos encargos derivados de apreensão do veículo por infrações administrativas de trânsito – multas, despesas de estadia, remoção e demais taxas correlatas – haja vista que a sanção aplicada em decorrência da infração de leis de trânsito não pode transcender do infrator e abranger o credor fiduciário que financiou a aquisição do veículo. Em hipóteses nas quais a apreensão do veículo ocorrer em razão de ordem judicial derivada de ação de busca e apreensão ajuizada pelo credor fiduciário, cabe-lhe arcar com os custos respectivos de estadia, remoção e demais taxas relativas à busca e apreensão do bem, excetuadas eventuais multas oriundas de infrações administrativas de trânsito praticadas pelo condutor.”

O incidente originou-se de ação ordinária acolhida em primeira instância na qual uma instituição financeira pretendeu a declaração de inexistência de relação jurídica com o Estado de Minas Gerais no que concerne à exigência de multas de trânsito, diárias de estadia e demais taxas originárias da apreensão de veículo alienado fiduciariamente. O pedido foi julgado procedente na 1ª Instância. Após apelação, o Desembargador Kildare Carvalho suscitou incidente de resolução de demandas repetitivas, objetivando a uniformização do entendimento relativo à essa matéria no Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

No julgamento, o Desembargador Alberto Vilas Boas, relator do caso, inicialmente apontou a existência de precedente do STJ (RESP 1114406) sobre a matéria e argumentou que a posse direta do veículo está com o devedor fiduciante, que se assemelha ao arrendante nos negócios de arrendamento mercantil. Logo, possuindo o bem, se o devedor fiduciante se comporta em desacordo com as leis de trânsito, a responsabilidade é pessoal, inclusive quanto aos encargos que se originem da apreensão do veículo.

Disse que em ambos os casos – arrendamento mercantil e alienação fiduciária – a instituição financeira não dispõe de propriedade plena sobre o veículo, pois a posse do bem pertence aos contratantes – arrendatários ou devedores fiduciantes. Estes, por sua vez, equiparam-se aos proprietários, pois possuem a posse direta do bem. Já o credor fiduciário detém a propriedade resolúvel e a posse indireta sobre bem, nos termos dos arts. 1.361 e 1.368-B, do CC/2002. No mesmo sentido são as previsões do CTB (art. 257) e da Resolução Contran 619/2016.

O CCBA teve participação ativa no processo judicial, que tem grande relevância para as instituições financeiras. De acordo com nosso sócio José Henrique Guaracy, o entendimento pacificado pelo TJMG é acertado: “A tese fixada pelo TJMG parte de uma compreensão sobre as características da propriedade fiduciária, essencialmente resolúvel, temporária e afetada. A decisão versa sobre as multas e encargos decorrentes de infrações de trânsito praticadas pelo condutor, sendo certa a inexistência de reponsabilidade da instituição financeira. Entendimento diverso viola princípios constitucionais como a intranscendência subjetiva das sanções, previsto no art. 5º, XLV, CRFB/1988.”

E complementa: “O entendimento uniformizado do TJMG reforça teses importantes na seara tributária. Entendemos que o credor fiduciário não é proprietário para fins de tributação pelo IPVA e sequer pode ser eleito como responsável tributário. Sobre esse tema, é imprescindível conferir a obra de nosso sócio fundador, Paulo Coimbra, ‘IPVA: Imposto sobre propriedade de veículos automotores’”.