Recentes alterações na legislação tributária e uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) têm incentivado as empresas a incluir regras para os programas de Participação nos Lucros ou Resultados da atividade empresária (PLR) em suas convenções e acordos coletivos. A inserção de cláusulas com metas e condições para o recebimento da PLR é uma boa estratégia para mitigar o risco de questionamentos por parte da Receita Federal quanto à não incidência de contribuições previdenciárias sobre a parcela.

A PLR consiste em um direito social dos trabalhadores, desvinculado da remuneração, conforme previsto no art. 7º, XI da Constituição de 1988. A referida verba é excluída expressamente da base de cálculo das Contribuições Previdenciárias quando paga em conformidade com sua lei regulamentadora, como estabelece o art. 28, § 9º, “j” da Lei nº 8.212/1991. Todavia, o STF, ao julgar o Tema nº 334 de Repercussão Geral, firmou a tese de que o mencionado dispositivo constitucional tem eficácia limitada e carece de densificação, a qual teria ocorrido somente com a edição da MP 794/1994, reeditada 13 vezes e convertida na Lei nº 10.101/2000.

A Lei nº 10.101/2000, estabelece, em seu art. 2º, duas modalidades de acordos de PLR: (i) aqueles decorrentes de comissão paritária escolhida pelas partes, integrada, também, por um representante indicado pelo sindicato da respectiva categoria; e (ii) os originados de convenção ou acordo coletivo de trabalho. Não obstante, algumas empresas vêm sendo autuadas pela Receita Federal sob o argumento de que o instrumento contratual para pactuação das regras de PLR não atende aos requisitos previstos por lei. Outras questões também são eventualmente levantadas pela Receita Federal, como a ausência de clareza e objetividade das regras do programa de PLR, por exemplo..

No entanto, com a prevalência do negociado sobre o legislado, reconhecida pelo STF no Tema nº 1.046 de Repercussão Geral, além de alterações na Lei nº 10.101/2000, promovidas pela Lei nº 14.020/2020, há maior expectativa de êxito nas discussões com o Fisco acerca dessa matéria. Esse prognóstico vem se intensificando desde o advento da Reforma Trabalhista, com a edição da Lei nº 13.467/2017, a qual inseriu o art. 611-A à CLT, estabelecendo que a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a legislação em determinados assuntos. A mesma lei também deu autonomia aos empregados hipersuficientes para que negociem os termos da sua relação de trabalho com o seu empregador.

No início de junho, ao julgar o mencionado Tema nº 1.046, o STF, por maioria, decidiu que as normas de acordos e convenções coletivas podem limitar ou mesmo afastar direitos trabalhistas, independentemente de específica explicitação de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis. Nesse sentido, o Ministro Relator Gilmar Mendes, acompanhado pela maioria, entendeu que o art. 611-B da CLT estabelece um rol taxativo dos direitos trabalhistas que não podem ser negociados. Já o art. supracitado 611-A da CLT prevê um rol exemplificativo dos direitos que podem ser negociados, inclusive o direito à participação nos lucros ou resultados da empresa, previsto no inciso XV desse dispositivo.

Por sua vez, em 2020, a supramencionada Lei nº 10.101/2001, que regulamenta a PLR, foi modificada para privilegiar as negociações. Dentre as modificações mais relevantes, destaca-se a alteração ao art. 2º, §6º, o qual passou a estabelecer que, na fixação dos direitos substantivos e das regras adjetivas, inclusive no que se refere à fixação dos valores e à utilização exclusiva de metas individuais, a autonomia da vontade das partes contratantes será respeitada e prevalecerá em face do interesse de terceiros.

Nesse novo contexto, percebe-se um movimento crescente das empresas para incluir, nas convenções e acordos coletivos do trabalho, cláusulas acerca dos critérios que devem ser levados em consideração para a distribuição de lucros e resultados, como forma de garantir mais segurança ao processo e evitar as autuações da Receita. Assim, têm sido previstas, por exemplo, regras de lucratividade e performance para recebimento da PLR. Outra alternativa é tratar sobre o tema em comissão paritária escolhida pelas partes. É recomendável que a forma de realização desse acordo seja avaliada de maneira estratégica, a fim de evitar questionamentos por parte da Receita Federal.

O sócio do CCBA, Onofre Batista, destaca a retomada da realização de programas de PLR pelas empresas: “Com o maior reconhecimento da prevalência do negociado sobre o legislado, percebe-se uma tendência crescente de as empresas promoverem acordos de PLR, após um período em que muitas delas se viram desestimuladas a firmar programas de PLR em razão das constantes autuações da Receita Federal sob justificativas, muitas vezes, desarrazoadas, relacionadas a detalhes não regulamentados por lei.”

“É recomendável que as cláusulas dos acordos de PLR tratem das regras e condições estabelecidas pela Lei nº 10.101/2001, principalmente com relação à periodicidade e critérios objetivos para aferição de desempenho. Isso porque o art. 3º, §2º desta norma estabelece que é vedado às empresas fazerem o pagamento em mais de duas vezes ao ano e em um período inferior a um trimestre. Ainda, o art. 2º, § 1º, II, da Lei nº 10.101/2001 prevê que os ‘programas de metas, resultados e prazos’ devem ser ‘pactuados previamente’. O descumprimento desse requisito tem sido objeto de autuações pela Receita e, inclusive, chegando a ser discutido no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), como já noticiamos”, acrescenta Onofre Batista.

“O recente julgamento do STF tem gerado maior segurança jurídica para essas negociações de PLR. Respeitadas as formalidades da negociação, será mais difícil contestar a validade jurídica desse instrumento e exigir o recolhimento de contribuições sobre a parcela. Mas, de todo modo, as regras da Lei nº 10.101/2001 devem ser respeitadas para que não se alegue a má utilização do instituto.”

Para saber mais sobre o tema, recomendamos a leitura da obra “A participação nos lucros ou nos resultados e os desafios tributários”, fruto de alentado estudo sobre o tema pelos nossos sócios Alice Jorge, Guilherme Bagno, Onofre Batista e Paulo Coimbra.

Também sobre o tema, os  sócios Onofre Batista, Paulo Coimbra e Guilherme Bagno publicaram artigo no Conjur, abordando, em especial, a Medida Provisória nº 905/2019.

O Coimbra, Chaves & Batista encontra-se à disposição para esclarecimentos e assessoria.