Em 15/12, o Plenário da Câmara dos Deputados aprovou a PEC 45/19, que estabelece a reforma do sistema tributário nacional. A proposta de reforma tributária recebeu aprovação no primeiro turno com 371 votos a favor e 121 contra, e no segundo turno com 365 votos favoráveis e 118 contrários. A maior parte das alterações realizadas pela Câmara no texto do Senado foi de caráter supressivo, mas a estrutura geral da reforma foi mantida. O texto aprovado resulta, então, de uma combinação entre o trabalho da Câmara, sob a relatoria do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), e do Senado, sob a relatoria do senador Eduardo Braga (MDB-AM). O texto final foi promulgado pelo Congresso Nacional, no dia 20/12, como a Emenda Constitucional 132/2023, e foi publicado no dia 21/12.

Neste informativo, disponibilizamos um resumo esquematizado dos principais aspectos da reforma tributária. A seguir, apresentamos nossa descrição e análise detalhada da EC 132/2023. O nosso sócio fundador Paulo Coimbra teceu comentários e críticas sobre o texto final da reforma, destacando os desafios que os contribuintes enfrentarão nos próximos anos.

 

MANUTENÇÃO DA ESTRUTURA PRINCIPAL DA REFORMA TRIBUTÁRIA

Na recente votação da Câmara dos Deputados, a estrutura principal da reforma tributária não foi alterada. Sendo assim, ainda será instituída uma tributação geral sobre o consumo, que se baseará na substituição de cinco tributos existentes hoje pelo que tem sido chamado de “Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual”, isto é, um tipo de tributo que incide de forma não cumulativa, abrangendo apenas o valor agregado a cada etapa produtiva.

Os tributos federais, Contribuição ao PIS, a Cofins e o IPI, serão reunidos na Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), sob a competência tributária federal. Em paralelo, o ICMS, estadual, e o ISS, municipal, serão unificados no formato do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com uma gestão compartilhada entre Estados e Municípios. O objetivo da reforma é de que os tributos não se acumulem ao longo da cadeia produtiva. Os parâmetros quantitativos para a incidência dos tributos ainda será objeto de regulamentação após a aprovação da PEC. A estimativa é de que a alíquota padrão gire em torno de 27,5% sobre o valor do produto.

Além disso, com a implementação da reforma, será instituído o tributo específico denominado Imposto Seletivo (IS), de competência federal. Este imposto terá incidência sobre bens e serviços reconhecidos como prejudiciais à saúde pública ou ao meio ambiente, abrangendo produtos como cigarros, combustíveis e bebidas alcóolicas. O IS não será aplicado às exportações e sobre bens e serviços beneficiados com a redução de alíquotas. A sua arrecadação será dividida com os demais entes da federação.

 

NOVAS ALTERAÇÕES NO TEXTO PROVENIENTE DO SENADO

A Câmara dos Deputados preservou a maior parte das alterações propostas pelo Senado Federal, restringindo-se a realizar modificações de natureza supressiva. A seguir, destacam-se as principais mudanças efetuadas pelos deputados no texto.

 

Regimes diferenciados

O Deputado Aguinaldo Ribeiro, na função de relator, optou por excluir certos regimes diferenciados que previam alíquotas reduzidas do IBS e da CBS. Notadamente, a proposta eliminou a possibilidade de redução em 100% das alíquotas do IBS e da CBS incidentes na aquisição de medicamentos e dispositivos médicos por entidades de assistência social sem fins lucrativos. O relator justificou essa exclusão argumentando que tal redução não poderia ser controlada de maneira eficaz. Além disso, o texto do relator aboliu a possibilidade de redução em 100% da alíquota incidente nas compras realizadas pela administração pública. O relator sustentou que esse benefício seria dispensável, uma vez que já existe um regime diferenciado previsto para as compras governamentais.

 

Cestas básicas

O texto aprovado no Senado incluía a criação de duas cestas básicas, a nacional e a estendida. Os itens essenciais da cesta básica nacional estariam isentos de IBS e CBS, enquanto o segundo grupo se submeteria a uma alíquota reduzida em 60%, com a concessão de cashback obrigatório para famílias de baixa renda. A cesta básica nacional foi mantida no texto aprovado pela casa.

A justificativa para a existência das duas cestas, conforme explicado pelo relator no Senado, Senador Eduardo Braga (MDB-AM), era evitar que uma ampla gama de produtos ficasse isenta de impostos após a aprovação da reforma, prejudicando demasiadamente a arrecadação. Mesmo assim, a Câmara dos Deputados rejeitou a proposta do Senado, eliminando a cesta básica estendida. O relator na Câmara argumentou que a PEC já prevê tratamento tributário favorecido para alimentos e produtos de higiene e considerou desnecessário impor ao legislador complementar decisões que deveriam ser avaliadas com base nos recursos e limitações de cada período.

Quanto ao cashback, o parecer apresentado à Câmara destacou que a PEC já contempla a possibilidade de instituir a devolução do IBS e da CBS a pessoas físicas para reduzir desigualdades de renda. A decisão sobre a implementação efetiva do cashback, por isso, foi deixada ao legislador complementar, sob a justificativa de que somente após a implementação do sistema seria possível ajustar o modelo de devolução.

 

Regimes específicos

Os regimes específicos de tributação do IBS e da CBS são aqueles que contemplam exceções ao regime geral, permitindo modificações nas alíquotas e bases de cálculo, inclusive impondo restrições ao crédito. Esses regimes não implicam, por si só, um tratamento mais vantajoso; ao contrário, podem constituir acréscimo na carga tributária.

No âmbito da Câmara, o relator excluiu diversos setores dos regimes específicos inicialmente propostos pelo Senado no texto da PEC. Esses setores são os seguintes: serviços de saneamento e de concessão de rodovias; serviços de transporte aéreo; operações que envolvam a disponibilização da estrutura compartilhada dos serviços de telecomunicações; bens e serviços que promovam a economia circular; e operações com microgeração e minigeração distribuída de energia elétrica.

O relator justificou a exclusão desses setores, sob o argumento de que a concessão de um regime especial para eles, que podem ser tributados pelo regime normal, poderia acarretar complexidades, ineficiências e potenciais litígios, além de sujeitar esses setores a tratamento mais oneroso do que as regras normais.

 

Combustíveis e lubrificantes

No tocante ao regime específico para o setor de combustíveis e lubrificantes, a Câmara eliminou um dispositivo introduzido pelo Senado. Tal dispositivo autorizava o Senado, mediante resolução, a fixar alíquotas uniformes. Antes dessa modificação das modificações dos senadores no texto, tal competência ficava subordinada à lei complementar, o que foi reestabelecido pela Câmara. A justificativa que consta no parecer do relator é a necessidade de uma discussão mais abrangente sobre o assunto, que não deve se restringir ao Senado.

 

Profissões liberais

Além disso, foi alvo de amplas discussões o regime tributário conferido ao setor das profissões liberais regulamentadas, tais como a advocacia, a arquitetura e a contabilidade. O Senado já tinha aprovado um texto que estabelecia uma alíquota reduzida de 70% da alíquota padrão para esses profissionais. Tal proposta foi preservada pelos deputados na votação do dia 15/12.

 

ZFM e ALC

A Câmara, seguindo o parecer do relator, modificou o regime tributário específico da Zona Franca de Manaus (ZFM) e Áreas de Livre Comércio (ALC). Foi retirada do texto a disposição que permitia a incidência da Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) sobre a importação, produção ou comercialização de bens com industrialização incentivadas nessas regiões. A CIDE tinha sido uma hipótese levantada pelo Senado para incidir sobre os produtos que concorriam com aqueles produzidos na ZFM. Da mesma forma, foi excluído o trecho da PEC que previa a destinação dos recursos arrecadados com a CIDE para a própria região Norte.

Como consenso, ao invés de manter a CIDE, optou-se por modificar o modelo de benefício tributário da ZFM, mantendo a vantagem competitiva por meio do IPI. Por isso, o texto aprovado pela Câmara estabelece que as alíquotas do IPI serão zeradas, a partir de 2027, para produtos que não sejam objeto de industrialização incentivada na ZFM.  Em outras palavras, a alíquota do IPI será zerada para produtos que não competem com aqueles produzidos na ZFM a partir de 2027. Esta medida valerá até 2073. A partir de então, o IPI será definitivamente extinto. A alíquota do IPI e o rol de mercadorias sujeitas ao tributo ainda será objeto de lei complementar.

 

Comitê Gestor do IBS

Quanto ao Comitê Gestor do IBS (anteriormente denominado Conselho Federativo), o parecer excluiu a disposição que permitia a sabatina e aprovação do presidente do comitê pelo Senado Federal. O parecer esclarece que essa previsão equiparava o presidente do Comitê Gestor a autoridades federais diretamente subordinadas à Presidência da República, muitas das quais com foro privilegiado para julgamento de crimes de responsabilidade.

Assim, considerando que o Comitê Gestor não é um órgão federal e seu controle externo é realizado pelos entes subnacionais, sem qualquer vínculo com a União, a referida disposição foi eliminada já no parecer do deputado relator. Além disso, o relator suprimiu a possibilidade de os tribunais de contas, por meio de órgão colegiado, exercerem o controle externo do comitê. Dessa forma, mantém-se apenas a previsão de que o controle externo do Comitê Gestor do IBS será realizado pelos Estados, pelo DF e pelos Municípios.

 

Transição Federativa

A Câmara dos Deputados eliminou o mecanismo destinado a premiar os entes federativos que demonstrassem maior eficiência em seus sistemas de arrecadação, por meio de um fator de transição. O relator da PEC na Câmara considerou que a implementação do referido mecanismo poderia gerar incertezas sobre a participação dos entes federativos subnacionais na arrecadação nacional.

 

Modificações na redação

O relator também ajustou redação de alguns dispositivos da PEC, sem, no entanto, modificar o seu conteúdo. Essas alterações abrangem o inciso II, do §1º, e também o §2º, ambos pertencentes ao art. 10 da PEC. Esses dispositivos tratam da aplicação de regime tributário específico aos serviços remunerados por tarifas e comissões e a outros prestados por instituições financeiras bancárias.

 

Supressão de “princípios” para alteração de normas tributárias

O relator Aguinaldo Ribeiro também suprimiu dois dispositivos que ele mesmo classificou como princípios tributários. Esses dispositivos tinham sido adicionados ao texto pelo Senado e vedavam que os entes federativos estabelecessem normas infralegais relacionadas à matéria tributária sem que houvesse divulgação abrangente dos estudos e pareceres que as fundamentassem. Além disso, as normas suprimidas determinavam que esses estudos deviam incluir uma avaliação do impacto das modificações legislativas para a complexidade e a capacidade arrecadatória do Sistema Tributário Nacional.

O relator também eliminou previsão que exigia que projetos de lei que instituíssem ou aumentassem tributos contivessem avaliações e demonstrações de seu impacto econômico-financeiro. O deputado relator argumentou que tais requisitos, ou “princípios”, tornariam o processo de alteração das normas tributárias excessivamente rígido e burocrático, dificultando significativamente as iniciativas dos entes federados.

 

OS PRINCIPAIS DESTAQUES

Incentivos fiscais para o setor automotivo

Os incentivos fiscais destinados às fábricas de veículos automotores nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste foram prorrogados até 2032. Isso ocorreu com a votação do Destaque 18 do Bloco MDB, que foi aprovado com 341 votos a favor, 153 contra e quatro abstenções. O benefício se aplica às empresas habilitadas envolvidas na produção de veículos movidos por motores de combustão interna, que utilizem biocombustíveis de forma isolada ou cumulativa com combustíveis derivados de petróleo. Além disso, foram realizadas modificações no regime tributário aplicável às autopeças.

 

Imposto Seletivo sobre armas e munições

No segundo turno de votação da PEC na Câmara, os deputados aprovaram um destaque que resultou na retirada do dispositivo que originalmente previa a incidência do imposto seletivo sobre armas e munições. Antes dessa modificação, o imposto seletivo deixaria de incidir apenas sobre as armas e munições destinadas à administração pública. Com a alteração aprovada nos dois últimos minutos da sessão de votação, o imposto seletivo não será aplicado a armas e munições, independentemente de sua destinação.

 

FASE DE TRANSIÇÃO PARA A UNIFICAÇÃO DE TRIBUTOS

A PEC aprovada estabelece um período de transição de sete anos, compreendido entre 2026 e 2032, para a unificação dos tributos, culminando na extinção total dos impostos vigentes hoje a partir de 2033. A transição segue um cronograma específico, começando em 2026 com alíquotas de teste de 0,9% para a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), referente ao Imposto sobre Valor Agregado (IVA) federal, e de 0,1% para o IVA compartilhado entre Estados e Municípios (IBS). No ano seguinte, em 2027, a Contribuição ao PIS e a Cofins serão eliminados, dando lugar à implementação integral da CBS, enquanto a alíquota do IBS permanecerá em 0,1%.

Entre 2029 e 2032, por sua vez, está prevista uma redução gradual das alíquotas do ISS e do ICMS, acompanhada de um aumento progressivo na alíquota do IBS. Em outras palavras, a transição para a extinção do ICMS e do ISS ocorrerá nesse período, com a diminuição gradativa de suas alíquotas e a redução proporcional dos benefícios e incentivos vinculados. Em 2033, o novo modelo tributário entrará em pleno vigor, marcando a extinção definitiva do ICMS e do ISS.

Como mencionado anteriormente, o texto aprovado pela Câmara também contempla a isenção das alíquotas do IPI para produtos não sujeitos à industrialização incentivada na ZFM, a partir de 2027, medida válida enquanto perdurar o regime da ZFM, ou seja, até 2073. Isto é, o IPI recairá sobre os produtos que competem com aqueles produzidos na ZFM até 2073. Também para 2027 está prevista a implementação efetiva do Imposto Seletivo.

 

PROMULGAÇÃO DA REFORMA TRIBUTÁRIA

O texto final da PEC 45/2019 foi assinado pelo Deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e promulgado em sessão do Congresso Nacional, no dia 20/12, como a Emenda Constitucional 132/2023. A publicação do texto ocorreu no dia 21/12.

 

CONCLUSÃO

A implementação da reforma de todo o sistema tributário nacional, abrangendo não apenas o consumo, exigirá um extenso trabalho do legislativo em 2024. Os parlamentares ainda devem votar leis complementares destinadas a regulamentar a reforma tributária aprovada em 2023, e alterações na Constituição destinadas à alteração do sistema tributário relativo à renda, por exemplo.

 

Leia a seguir o que diz nosso sócio, Paulo Coimbra, sobre o assunto:

Desde a Assembleia Constituinte de 1988 ninguém duvida da necessidade de uma reforma tributária. Porém, é preciso ter cautela antes de atestar o tamanho do saldo positivo decorrente da promulgação da Emenda Constitucional 132/2023. A reforma da tributação do consumo é um passo significativo, mas demanda parcimônia diante dos seus desafios e potenciais impactos para os contribuintes.  

 O Congresso Nacional aprovou essa reforma a partir de debates que não condizem com a complexidade que o tema exige. A prejudicialidade desse furor legislativo é perceptível em dois erros de timing. O primeiro equívoco reside no fato de que uma reforma tributária deveria suceder uma reforma administrativa do Estado. Isso permitiria compreender a extensão da burocracia e, assim, formular o sistema tributário necessário para sustentá-la de maneira eficiente. O segundo erro é que a reforma foi realizada logo após uma pandemia que deixou o Estado mais carente de receitas, e, como diz o ditado, que parece agora esquecido, “não se deve ir com tanta fome ao prato, nem com tanta sede ao pote”. A moderação e o equilíbrio que esse antigo adágio apregoa são virtudes que não condizem com a avidez arrecadatória da União ao longo de 2023, nem com a rapidez da aprovação, nesse ano, da PEC 45/2019. 

 O exercício do poder constituinte derivado é limitado para que qualquer revisão de normas constitucionais seja objeto de ampla reflexão e questionamento. No entanto, a realização de sessões contínuas, como foi a última do dia 15/12, na Câmara dos Deputados, deturpa a limitação expressa que exige a votação em dois turnos nas duas Casas do Congresso Nacional. Afinal, as limitações do processo legislativo não são meros obstáculos formais, mas sim garantias da estabilidade rígida, como dizem os constitucionalistas, que confere supremacia ao texto constitucional. O atropelamento dos estritos termos desse processo, sobretudo quando se trata de emendas constitucionais, fere a lógica e a primazia da CRFB/88 e, infelizmente, agride a legitimidade democrática da reforma

 Apesar dos atropelos, ao menos merece elogios a retirada, pela Câmara dos Deputados, do mecanismo de premiação dos entes federativos com distribuição maior de receita por eficiência na arrecadação. Mesmo assim, devido à inclusão dessa medida no texto pelo Senado, houve uma onda de aumento de tributos em várias unidades federativas, razão pela qual é possível afirmar que a reforma, mesmo antes de aprovada, já gerou algum aumento da carga tributária. O Senado deu a largada, mas, desta vez, a Câmara não referendou a corrida de arrecadação. Isso só mostra que o caminho para a efetiva simplificação e melhoria do sistema tributário é longo, sujeito a muitas influências e repleto de obstáculos, o que requer atenção e revisão constante. 

 A complexidade da transição ainda é agravada pela necessária coexistência de legislações distintas, o que exigirá dos contribuintes o entendimento tanto da normativa atual quanto da nova, incluindo as diferentes obrigações acessórias que surgirão inevitavelmente. Ademais, já há quem aponte a possível manutenção do mecanismo de tributação de base sobre base, que, ao aumentar a alíquota efetiva dos tributos, contrapõe os objetivos da reforma.  A ideia de simplificação que motivou a aprovação da PEC também pode ser questionada em razão da manutenção da incidência do IPI, de 2027 até 2073, sobre todas as mercadorias concorrentes com as produzidas da Zona Franca de Manaus. Em 2027, quando for implementado o Imposto Seletivo (IS), a CBS e o adicional de IBS (0,1%), lá estará o mesmo IPI de hoje, além do ICMS e do ISS. Estes dois últimos estão incluídos no plano de substituição pelo modelo de tributação do valor agregado (CBS e IBS) e serão extintos em 2033. O IPI, por outro lado, continuará por mais 50 anos.  

 Assim, apesar das garantias do relator da reforma na Câmara quanto à estabilidade da carga tributária, há incertezas, visto que estimativas de alíquotas em torno de 26% e 27% para CBS e IBS, que assim já estariam dentre as maiores do mundo, também podem se mostrar irrealistas diante dos desafios mencionados. A estranheza dessas alíquotas ainda se avulta diante do fato incontestável de que temos um serviço público que está longe de ser um dos melhores do mundo, em razão da ineficiência do Estado. Assim, se todo dinheiro arrecadado pela Fazenda padece das deficiências e ineficiências da gestão dos recursos públicos do Brasil, a política de cashback que a reforma prevê pode estar fadada ao fracasso, pois pressupõe uma eficiência administrativa que inexiste em nosso País. 

 Por outro lado, a extrafiscalidade, ao invés do cashback, poderia ser um bom caminho para evitar as agruras da ineficiência do Estado. No entanto, a Reforma, denotando mais uma vez o furor arrecadatório da União, prevê, com o Imposto Seletivo, um mecanismo de desestímulo de comportamentos considerados nocivos a partir do agravamento da tributação, ao passo que a outra face da extrafiscalidade, voltada ao estímulo de comportamentos desejáveis a partir da atenuação da tributação, foi terminantemente castrada pelo enrijecimento do sistema constitucional tributário. A vedação de alíquotas e regimes diferenciados, que alegadamente se justifica pela má utilização desses mecanismos nos últimos anos, ignora a função que esses poderiam cumprir como instrumentos de política pública. Parece que, nesse aspecto, a reforma “jogou fora o bebê junto com água do banho”. Um remédio auspicioso foi descartado por ter sido administrado sem diagnóstico e sem posologia adequada, enquanto as doenças que ele poderia tratar persistem. 

 Todos esses cenários problemáticos se agravam em razão da expectativa de regulamentação de cerca de 70 aspectos da EC 132/2023 por meio de lei complementar, o que acresce a incerteza sobre os efeitos da reforma. Isso torna imperativo o acompanhamento de perto de todas as alterações legislativas que virão nos próximos anos. Essa vigilância constante também se revela essencial para compreender as nuances das mudanças e suas implicações práticas, pois somente assim será possível viabilizar a adaptação eficaz dos contribuintes às novas regras, garantindo a conformidade e o melhor planejamento tributário em face da nova realidade jurídica que se instaura a partir de agora. 

 

O CCBA está acompanhando atentamente as movimentações no Congresso Nacional e encontra-se à disposição para esclarecimentos e assessoria.