Em entrevista para o portal Legislação & Mercados, nosso sócio Paulo Coimbra comenta sobre os destaques da nova rodada de Refis em que estados e municípios têm oferecido condições especiais para contribuintes renegociarem dívidas tributárias. Leia no recorte abaixo:

 

Com o objetivo de reforçar os cofres públicos, em muitos casos fortemente prejudicados pela crise da pandemia, estados e municípios têm lançado programas especiais de negociação de débitos tributários, conhecidos genericamente como “Refis”. Trata-se de tentativas de incentivar os contribuintes a, diante de condições especiais para pagamentos, quitarem ao menos parte de suas dívidas com os fiscos estaduais e municipais.

“Por um lado, esses programas são ferramentas que privilegiam os contribuintes em geral, submetidos a encargos tributários e financeiros escorchantes, ao verem suas vidas fiscais regularizadas. Ademais, favorecem o aumento da arrecadação no curto prazo, benéfica para o fluxo de caixa do poder público. Por outro, podem ser deletérios, caso favoreçam devedores contumazes em detrimento dos que pagam os seus tributos em dia, premiando o comportamento ilícito e antiético”, analisa Paulo Coimbra, sócio do Coimbra & Chaves Advogados.

Na lista de entes com novos Refis, Coimbra menciona Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Pernambuco, Sergipe, Alagoas, Piauí, Fortaleza e Porto Alegre. “Em âmbito municipal, aguarda-se com grande expectativa a regulamentação do Programa de Parcelamento Incentivado (PPI) a ser promovido pela prefeitura de São Paulo, já aprovado na Câmara de Vereadores e sancionado pelo prefeito, mas que resta ainda a ser regulamentado”, completa.

A seguir, Coimbra trata de outros aspectos desses programas de parcelamento.

 

Estados e municípios têm autonomia para criar seus próprios programas ou estão submetidos a regras federais? Como funciona essa dinâmica, do ponto de vista federativo?

Atendidas as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal, notadamente a estimativa do impacto orçamentário e a não afetação das metas de resultados fiscais estipuladas, os estados e os municípios podem, no âmbito dos tributos e valores administrativos que lhes competem, criar seus próprios programas de negociação de débitos tributários e valores incorporados à dívida ativa. Essa autonomia decorre do pacto federativo adotado pela Constituição de 1988.

O parcelamento deve se dar por meio de lei específica aprovada pelas respectivas assembleias legislativas estaduais e câmaras municipais, sancionadas pelos respectivos chefes do Poder Executivo (governadores e prefeitos), podendo tratar de débitos tributários e não tributários (como multas ambientais, administrativas, dentre outras). Os chamados “Refis” trazem consigo vantagens para os contribuintes para a regularização fiscal e também benefício ao ente tributante, na medida que tendem a favorecer a arrecadação de valores até então inadimplidos. Muito raramente esses programas proporcionam uma diminuição do valor do tributo devido (remissão), restringindo-se, no mais das vezes, à possibilidade de parcelamentos com prazos mais dilatados ou redução do valor dos débitos relativos às multas e aos juros (anistia).

Por força da legislação, os estados não podem conceder remissões, anistias ou parcelamentos referentes ao seu principal tributo, qual seja, o ICMS, sem a aprovação do Confaz, órgão colegiado interfederativo composto pelos secretários de Fazenda, Finanças ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal, cujas reuniões são presididas pelo ministro da Fazenda.

 

Na sua opinião, esses programas são boas ferramentas à disposição do poder público? Por quê?

Por um lado, esses programas são ferramentas que privilegiam os contribuintes em geral, submetidos a encargos tributários, financeiros e penalizatórios escorchantes, ao verem suas vidas fiscais regularizadas. Ademais, favorecem o aumento da arrecadação no curto prazo, benéfica para o fluxo de caixa do poder público — o que é positivo sobretudo em períodos em que há diminuição da arrecadação, como acontece agora com a pandemia de covid-19 e o consequente encolhimento das atividades econômicas, podendo afetar gravemente serviços sociais.

Por outro lado, podem ser deletérios, caso favoreçam devedores contumazes em detrimento dos que pagam os seus tributos em dia, premiando o comportamento ilícito e antiético. Além disso, considerando que os descontos são muitas vezes atrativos e o fato de oferecerem melhores condições de pagamento, frequentemente são impostas como requisitos à adesão a renúncia de teses jurídicas plausíveis e a confissão da dívida.

 

Para os contribuintes, sempre vale a pena aderir aos Refis ou a decisão envolve uma avaliação de riscos?

Não há (e nem deve haver) uma opinião apriorística, sendo necessário uma análise caso a caso. Cabe uma decisão serena e refletida de cada contribuinte, de cada uma de suas eventuais pendências, para a adesão ou não a esses programas. Isso porque teses jurídicas que têm grande probabilidade de prosperar no Judiciário deverão ser renunciadas, com a formalização de confissão da dívida

 

Nessa atual rodada, algum Refis estadual ou municipal se destaca em termos do que oferece aos contribuintes? Qual seria?

Sem a pretensão de apresentar um rol exaustivo, mas meramente ilustrativo, cabe mencionar o “Super Refis”, apresentado pelo Estado do Rio Grande do Norte, que abrange qualquer débito de ICMS com vencimentos até o dia 31 de julho de 2020 e os débitos de IPVA com fatores geradores até 31 de dezembro de 2019. Há também o programa “Recomeça Minas”, apresentado pelo Estado de Minas Gerais, que contempla impostos (ICMS, IPVA e ITCMD) e taxas estaduais, com descontos sobre os juros e multas. Há o Refis do Estado do Mato Grosso, com descontos nas multas e juros, além de parcelamento, em valores relativos ao ICMS. E há também outros Refis implementados, que também podem ser citados, como os dos estados do Rio de Janeiro, Goiás, Pernambuco, Sergipe, Alagoas e Piauí.

Em âmbito municipal, aguarda-se com grande expectativa a regulamentação do Programa de Parcelamento Incentivado (PPI) a ser promovido pela prefeitura de São Paulo, já aprovado na Câmara de Vereadores e sancionado pelo prefeito, mas que resta ainda a ser regulamentado. O PPI oferecerá descontos nos valores dos juros e das multas, dos encargos moratórios e oferecerá condições especiais de parcelamento dos débitos tributários e não tributários. Ademais, foi enviado Projeto Legislativo à Câmara Municipal de Belo Horizonte para concessão aos contribuintes de descontos para pagamento à vista ou parcelado de créditos vencidos até 31 de dezembro de 2020. Outros Refis que podem ser mencionados são os das capitais Fortaleza (CE), Curitiba (PR) e Porto Alegre (RS).

No âmbito da União, aguarda-se a tramitação do Projeto de Lei do Senado (PLS) 4.728/20, que reabre o Programa Especial de Regularização Tributária (Pert) e ajusta seus prazos e modalidades de pagamento, além do chamado “passaporte tributário” negociado pelo governo federal com as casas legislativas, a fim de oferecer um programa de negociação das dívidas e alívio financeiro com repactuação das dívidas pelas empresas afetadas pela pandemia. Considerando as dificuldades financeiras sofridas pelas empresas e também pelos entes tributantes, é de se esperar que outros vários programas venham a ser aprovados num futuro próximo.

 

Fonte: Legislação & Mercados