A 14ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, por unanimidade, negou provimento ao agravo de instrumento interposto pela Fazenda Municipal, firmando o entendimento de que uma instituição bancária não deve compor o polo passivo de uma execução fiscal em que se cobre IPTU. Para a relatora, Desembargadora Mônica Serrano, “o credor fiduciário possui somente a propriedade resolúvel e a posse indireta do bem, como garantia do valor financiado, sem os demais direitos que caracterizam a propriedade”, razão pela qual deve ser excluído do polo passivo da execução fiscal de IPTU. Ela indica, ainda, que esse entendimento se coaduna com a jurisprudência do STJ.

A decisão de origem, do juiz Rafael Saviano Pirozzi, da Vara das Execuções Fiscais Municipais de São Paulo, acolheu a exceção de pré-executividade em execução fiscal de IPTU, reconhecendo a ilegitimidade passiva da instituição financeira. Assim, extinguiu a exação em relação a ela, tendo em vista sua condição de credora fiduciária do imóvel. Para o juiz, “o proprietário fiduciário de imóvel não pode ser considerado contribuinte de IPTU, na medida em que, conforme definido no art. 1.228 do Código Civil, o proprietário é aquele possuidor dos direitos de uso gozo e disposição do bem, os quais, tratando-se de alienação fiduciária, são atribuídos ao devedor fiduciante”. Em suas palavras, “a propriedade resolúvel exercida pelo credor fiduciário é limitada, pois conferida como mera garantia de contrato particular, e, portanto, desprovida dos poderes que lhe são ordinariamente atribuídos, uma vez que este não objetiva a efetiva aquisição da propriedade”.

O Município, por sua vez, defende que a instituição financeira é parte legítima para responder pela exação visto que “i) o credor fiduciário detém a propriedade resolúvel e a posse indireta do imóvel; ii) o executado era proprietário do imóvel por ocorrência do lançamento, nos termos do art. 34 e art. 117, II, do CTN; iii) a disposição do art. 27, §8º, da Lei nº 9.514/1997 é inaplicável à hipótese, eis que a responsabilidade tributária sujeita-se à disciplina de lei complementar, bem como que o seu objetivo era regulamentar a alienação fiduciária entre instituição financeira e os tomadores de crédito, tendo verdadeira natureza de regulamentação contratual e, assim, não surtindo efeitos sobre os direitos de terceiros e trazendo a aplicação do art. 123, CTN; iv) compete ao Município a edição dos diplomas legais referentes aos tributos de sua competência, não sendo aplicável qualquer legislação federal ao caso, sob pena de violação do pacto federativo; v) tal circunstância excepcional (transferência da responsabilidade) somente se dá em decorrência da consolidação da propriedade nos casos de inadimplemento, ou seja, não é a regra, mas sim exceção”.

Não obstante, o tribunal, em sua decisão, consignou que a jurisprudência do STJ é de que “somente a posse com animus domini é apta a gerar a exação predial urbana”, conforme manifestação proferida pela 2ª Turma no REsp nº 1.758.594/MG, de relatoria do Ministro Herman Benjamin. Os desembargadores destacaram, ainda, que a 14ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo possui firme entendimento de que deve ser reconhecida a ilegitimidade passiva do credor fiduciário. A decisão foi proferida nos autos do Agravo de Instrumento nº 2015734-54.2023.8.26.0000.

A questão será apreciada pela 1ª Seção do STJ, que afetou a controvérsia ao tema repetitivo de nº 1158, em que definirá “se há responsabilidade tributária solidária e legitimidade passiva do credor fiduciário na execução fiscal em que se cobra IPTU de imóvel objeto de contrato de alienação fiduciária”.

Para nosso sócio fundador, Paulo Coimbra, “a decisão do tribunal é acertada, visto que esse entendimento está de acordo com a matriz constitucional do tributo. O IPTU, recorde-se, é um imposto de competência municipal que onera o patrimônio, mais especificamente a propriedade imobiliária situada em zona urbana, tanto a propriedade predial, ou seja, as edificações, como também a propriedade territorial. O Direito Tributário, com notável frequência, utiliza-se de conceitos já definidos legalmente, em outros subsistemas do Direito. No caso, deve-se observar que o art. 1.228 do Código Civil define como proprietário aquele que tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. Nesse sentido, qualquer pretensa definição da hipótese de incidência, na lei municipal, que extrapole os lindes fixados pelo legislador constituinte na regra matriz do tributo revela-se inadequada e inconstitucional.”

O Coimbra, Chaves e Batista encontra-se à disposição para esclarecimentos e assessoria.