No dia 26/10/2021 foi publicado o acórdão 9101-005.761, em que a 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) entendeu que a realização de planejamento tributário, ainda que configurado como abusivo pelas autoridades competentes, não pressupõe o dolo necessário para caracterizar a ocorrência de sonegação, fraude ou conluio. A importância dessa intepretação está relacionada, principalmente, com o afastamento da multa qualificada, de 150% sobre o valor da dívida, e com a consequente limitação da condenação ao pagamento da multa simples, de 75%. 

Tal entendimento prevaleceu no âmbito do processo 19515.721820/2013-90 do CARF, que tratou dos autos de infração de Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido decorrentes da glosa de despesas de amortização de ágio na aquisição de investimentos de um determinado contribuinte. Esse tema foi analisado pela 1ª Turma do CSRF em sessão do dia 03/10/2017, oportunidade em que restou decidido que as despesas registradas pelo contribuinte não poderiam ser deduzidas das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL (Acórdão 9101-003.132). Entretanto, a matéria relativa à aplicação da multa qualificada não foi enfrentada e os autos retornaram à 1ª Turma Ordinária da 3ª Câmara do CARF. Por isso, apenas no dia 25/07/2018, em apreciação complementar realizada pela 1ª Turma Ordinária da 3ª Câmara do CARF, os membros desse colegiado, por unanimidade de votos, reduziram a multa de ofício de 150% para 75%.  

A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) recorreu da decisão interpondo Recurso Especial, em face do qual o contribuinte apresentou contrarrazões. Assim, sob a relatoria do Conselheiro Fernando Brasil de Oliveira Pinto, na sessão do dia 08/09/2021, a 1ª Turma do CSRF, em síntese, decidiu 1º) que se não há comprovação da ocorrência de sonegação, fraude ou conluio, não há fundamento para a qualificação da multa; 2º) que os institutos do abuso de direito e da fraude à lei não foram eleitos pelo legislador tributário como razões para qualificação da multa; e 3º) que, ainda que o planejamento tributário seja considerado abusivo, não há razões para que seja presumido dolo apto a ensejar a qualificação da multa, principalmente quando não há ocultação da prática e da intenção final dos negócios realizados. 

Paulo Roberto Coimbra da Silva, sócio fundador do CCA, ressalta a relevância de que a aplicação de penalidades a infrações tributárias seja realizada levando em consideração a culpabilidade dos contribuintes envolvidos. “Não se admite, em um Estado Democrático de Direito como o nosso, que a imposição de penalidades seja pautada em meras presunções. Especialmente a aplicação da multa qualificada demanda que seja comprovado o dolo de impedir ou retardar, total ou parcialmente, a ocorrência ou o conhecimento por parte da autoridade fazendária sobre os fatos geradores dos tributos devidos.” 

Paulo defende que o entendimento da Câmara Superior nesse caso seja aplicado também a outras situações, além daquelas relacionadas a planejamento tributário e amortização de ágio. Para ele “O exercício de direitos, por vezes, pode ser considerado abusivo por parte das autoridades fazendárias, em razão de divergências quanto a interpretações jurídicas. Isso, por si, não é suficiente para que a conduta seja caracterizada como fraudulenta ou sonegatória e não justifica a imposição de multa de 150%, especialmente quando não há ocultação ou distorção de fatos. Situação similar àquela apreciada recentemente pela CSRF tem acontecido com frequência quanto à autocompensação de créditos de contribuições previdenciárias. Esperamos que a Câmara mantenha a coerência do seu entendimento e afaste a multa agravada também nesses casos.”. 

Para saber mais sobre o tema das infrações tributárias, assista a palestra proferida por Paulo Coimbra no Congresso da ABRADT, em 09/11/2021.