Está em tramitação no Senado Federal o Projeto de Lei n. 1363, de 2021, que visa adicionar um novo parágrafo ao art. 57 da Lei n. 8.213/1991, de forma a esclarecer que não será devida a contribuição social adicional (ADRAT) quando houver a utilização de equipamentos de proteção coletiva ou individual que neutralizem ou diminuam a exposição do trabalhador aos agentes nocivos a níveis legais de tolerância, inclusive em relação ao agente nocivo ruído. A questão é polêmica em virtude de posicionamento da Receita Federal no sentido de exigir a contribuição adicional sobre a remuneração de quaisquer trabalhadores que trabalhem expostos a ruídos superiores ao limite de tolerância, independentemente da existência e da eficácia comprovada de equipamentos de proteção.

Ao justificar a proposição do Projeto de Lei, o senador Luis Carlos Heinze afirma que “a alteração aqui proposta já tem previsão legal no ordenamento jurídico brasileiro. No entanto interpretações da legislação mantém a obrigatoriedade, mesmo que a empresa adote as medidas de proteção individual ou coletiva que elidam ou reduzam a níveis legais a ação do agente insalubre”. Afirma, ainda, que “tem, como objetivo, incentivar os empregadores a investirem em saúde e segurança do trabalho, buscando a eliminação ou neutralização da insalubridade em relação ao agente nocivo ruído.”

Empresas cujas atividades envolvam agentes nocivos à saúde devem se atentar às regras para incidência do ADRAT. Instituído pelos §§6º e 7º do art. 57 da Lei n. 8.213 de 1991, o Adicional à Contribuição ao Risco Ambiental do Trabalho (ADRAT) tem incidência exclusiva sobre a remuneração do segurado que trabalhe exposto a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou integridade física. O adicional à contribuição previdenciária tem ligação direta com o direito à aposentadoria especial. Não havendo direito ao benefício previdenciário correlato, não há que se falar em contribuição adicional. O dispositivo legal mencionado dispõe que a nocividade do ambiente de trabalho é qualificada pela permanência (não ocasional e nem intermitente) da exposição ao risco.

Sócios do Coimbra, Chaves e Batista Advogados publicaram obra a respeito do tema: O Adicional à Contribuição ao Risco Ambiental do Trabalho (ADRAT) e a aposentadoria especial, na qual afirmam que o direito à “aposentadoria especial apenas se verifica quando a exposição aos fatores de risco for inarredável e intrinsecamente vinculada ao desempenho de suas funções. Portanto, a exposição pode ser considerada permanente apenas quando não houver ‘liberdade’ por parte do trabalhador de recusar essa exposição.”(p. 48)

O STF analisou a questão no âmbito do RE 664.335/SC, tendo firmado as seguintes teses: “I – O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; II – Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.” Depois desde julgado, a Receita Federal passou a interpretar (de maneira equivocada, a nosso ver) que é devida a contribuição adicional sobre a remuneração de quaisquer trabalhadores que trabalhem expostos a ruídos superiores ao limite de tolerância, independentemente da existência e da eficácia comprovada de equipamentos de proteção.

Em linha com o que foi decidido pelo STF, o art. 58 da referida Lei n. 8.213 prevê que deve haver comprovação de efetiva exposição ao agente nocivo. Por essa razão, os nossos sócios afirmam que “inexistindo riscos ao empregado em razão da adoção de EPI ou Equipamento de Proteção Coletiva (EPC), não há de se falar em aposentadoria especial e, em consequência, descabe a incidência do ADRAT” (p. 54). Tal posicionamento, para além do artigo citado, também tem supedâneo legal na Instrução Normativa RFB n. 2110/2022, em seu art. 232, § 2º, o qual prevê que não será devida a contribuição de adicional ADRAT na constância de adoção de medidas de proteção coletiva ou individual que neutralizem ou reduzam o grau de exposição do trabalhador a níveis legais toleráveis, de forma a afastar a concessão da aposentadoria especial. Apesar disso, a própria Receita Federal tem presumido a ineficácia de equipamentos de proteção especialmente em relação à exposição a ruído em patamar superior ao limite, independentemente da utilização de equipamentos de proteção.

Como reitera a obra supramencionada “ao exigir a ‘exposição efetiva’, o constituinte/legislador individualizou a conduta descrita na hipótese de incidência da norma tributária. É necessário demonstrar não apenas que um empregado específico exerce função que exige a sua exposição ao agente nocivo, mas, também, que a exposição subsiste com o uso de técnicas e equipamentos de proteção coletiva e individual, se elas forem garantidas pelo empregador (contribuinte).” (p. 61)

Quanto aos agentes cancerígenos, o entendimento que prevalecia na jurisprudência e na doutrina era de que a simples presença do agente nocivo cancerígeno, como o benzeno, no ambiente de trabalho ensejaria o reconhecimento da efetiva exposição do trabalhador. Prevalecia, portanto, o posicionamento de que a avaliação deveria ser qualitativa quanto aos riscos desses agentes nocivos, desconsiderando quaisquer limites de tolerância e presumindo-se a existência de condição especial de trabalho quando na presença desse tipo de agente.

Entretanto, com o advento do Decreto n. 10.410/2020, houve atualização do § 4º do art. 68 do Decreto n. 3.048, que passou a prever que os agentes reconhecidamente cancerígenos para humanos serão analisados pelo crivo da comprovação efetiva da exposição (por meio de documento emitido pela empresa ou laudo de profissional habilitado). Em somatório a isso, o parágrafo citado ainda estabelece que, caso adotadas medidas previstas na legislação trabalhista que eliminem a nocividade, será descaracterizada a efetiva exposição.

Para nosso sócio fundador, Paulo Coimbra, “o Projeto de Lei, se vier a ser aprovado, terá potencial para reduzir muito a litigiosidade em torno do tema, pois tornará em lei a interpretação adequada do julgado do STF. Não obstante o contribuinte ainda enfrente alguns percalços na demonstração de seu direito, a alteração do Regulamento da Previdência em relação aos agentes cancerígenos certamente repara o equívoco promovido anteriormente pelo Decreto 8.123/2013, atinente a uma hipótese de ‘exposição ao risco presumida’. O Executivo, no exercício do poder regulamentar, não deve fazer as vezes do legislador e promover inovações na ordem jurídica, mas apenas detalhar o que já conta com previsão legal”.

Paulo ressalta, ainda, que “elidir a incidência do Adicional ao RAT quando são tomadas medidas eficientes para inibir a ação nociva de tais agentes é medida indutora de comportamento, ao passo que estimula a adoção de condutas protetoras por parte dos empregadores e empregados. O objetivo da norma é, sobretudo, a proteção da saúde dos segurados, através da prevenção da ação nociva de condições ambientais do trabalho.”

“Inclusive, submeter empresas que garantem aos seus empregados mecanismos comprovadamente eficientes na prevenção de acidentes às mesmas condições impostas às empresas que não garantem tais condições configura violação inconteste à isonomia, bem como é um desestímulo à adoção das medidas protetivas dos obreiros – repita-se, objetivo da norma”, complementa Paulo.