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No dia 12 de janeiro de 2023, o Poder Executivo publicou uma série de atos normativos com relevantes impactos tributários. Conforme anunciado em 11/01, o objetivo das medidas é combater o déficit fiscal. A expectativa é de que pacote de medidas aumente a arrecadação e possibilite, ao final, a reversão do resultado negativo de aproximadamente R$ 231 bilhões. A previsão, a princípio, é de obter um superávit de R$ 11 bilhões. Dentre as principais mudanças, destacam-se a criação do Programa de Redução de Litigiosidade Fiscal (PRLF), a exclusão do ICMS da base de cálculo dos créditos do PIS/Cofins e a restauração do voto de qualidade no CARF.

 

PROGRAMA DE REDUÇÃO DE LITIGIOSIDADE FISCAL – PRLF

A Portaria Conjunta PGFN/RFB n. 1, de 12 de janeiro de 2023 institui o Programa de Redução de Litigiosidade Fiscal (PRLF), uma modalidade de transação excepcional na cobrança da dívida em contencioso administrativo tributário no âmbito de Delegacia da Receita Federal de Julgamento (DRJ), do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) e de pequeno valor no contencioso administrativo ou inscrito em dívida ativa da União. Podem ser transacionados os créditos tributários em litígio com recurso pendente de julgamento, exceto aqueles apurados pelo Simples Nacional. A adesão ao PRLF poderá ser formalizada das 8h de 1º de fevereiro até às 19h de 31 de março de 2023.

O PRLF inclui modalidades de Transação na Cobrança de Créditos Tributários em Contencioso Administrativo Fiscal, que variam conforme a recuperabilidade do crédito e capacidade de pagamento do contribuinte. Também há modalidades envolvendo o Contencioso de Pequeno Valor, aplicável a créditos de até 60 salários-mínimos que tenham como sujeito ativo pessoa natural, microempresa ou empresa de pequeno porte.

De maneira geral, o PRLF envolve: (i) o parcelamento dos créditos tributários, observados os limites previstos na lei de regência da transação; (ii) a concessão de descontos aos créditos considerados irrecuperáveis ou de difícil recuperação; (iii) a utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), observados os limites máximos previstos na lei de regência da transação e o previsto nesta Portaria; e (iv) a possibilidade de utilização de créditos líquidos e certos, devidos pela União, suas autarquias e fundações públicas, próprios do interessado ou por ele adquiridos de terceiros, decorrentes de decisões transitadas em julgado para quitação ou amortização do saldo devedor da transação, observada a Portaria Normativa AGU n. 73/2022.

 

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1158/2023 – VINCULAÇÃO DO COAF AO MINISTÉRIO DA FAZENDA

Foi publicada, também no dia 12 de janeiro de 2023, a Medida Provisória nº 1158, que disciplina a estrutura do Conselho Monetário Nacional e da Comissão Técnica da Moeda e do Crédito e estabelece a vinculação administrativa do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) ao Ministério da Fazenda. Além disso, a MP regulamenta o tratamento de dados pessoais pelo Coaf, no âmbito do combate à lavagem de dinheiro.

A MP altera a Lei nº 9.069/1995 e determina que o Conselho Monetário Nacional, até então presidido pelo Ministro da Economia volta a ser composto e presidido pelo Ministro da Fazenda. O Conselho Monetário Nacional volta a ser integrado pelo Secretário-Executivo do Ministério do Planejamento e Orçamento.

Alguns dispositivos da Lei nº 13.974/2020 também foram alterados. O Coaf, antes vinculado administrativamente ao Banco Central do Brasil, passa a ser vinculado ao Ministério da Fazenda. A partir de então, o Ministro da Fazenda é competente para escolha e nomeação do Presidente do Coaf e os membros do Plenário, para disciplina do processo administrativo sancionador. Não obstante as alterações administrativas, a MP preserva os atos normativos e administrativos editados pelo Coaf anteriormente.

Por fim, a MP incluiu o art. 17-F na Lei nº 9.613/1998, com objetivo de regular e limitar o tratamento dos dados pessoais no âmbito dos procedimentos relativos ao combate ao crime de lavagem de dinheiro. O dispositivo visa à preservação das informações, além da utilização vinculada ao atendimento das finalidades legais.

 

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1159/2023 – EXCLUSÃO DO ICMS DOS CRÉDITOS DE PIS/COFINS

A Medida Provisória n. 1.159, também publicada na edição extra do Diário Oficial da União no dia 12 de janeiro de 2023, alterou a legislação que dispõe sobre a não cumulatividade do PIS e da Cofins (Leis n. 10.637/2002 e 10.833/2003).

A referida MP incluiu o inciso XIV, no §3º, do artigo 1º, de ambas as leis, passando a prever expressamente que as receitas referentes ao valor do ICMS que tenha incidido sobre a operação não compõem a base de cálculo dos Programas de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Essa alteração está em sintonia com o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema de Repercussão Geral n. 69 (leading case, RE 574.706), amplamente conhecido como a “tese do século”. Nesse julgamento, o STF definiu que O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins.

Por outro lado, a MP n. 1.159/2023 também passou a prever de forma expressa que o contribuinte não terá direito a crédito de PIS e Cofins em relação ao valor do ICMS que incidiu na operação de aquisição (art. 3º, §2º, III). Essa medida vai em contramão à Instrução Normativa n. 2.121/2022, publicada em 15 de dezembro, que possibilitou a inclusão do ICMS incidente na venda pelo fornecedor, com exceção àquele cobrado pelo vendedor dos bens ou prestador de serviços na condição de substituto tributário (art. 170, I, c/c art. 171, II). Essa restrição à apuração de créditos das referidas contribuições produzirá efeito apenas a partir de 1º de maio de 2023.

 

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1160/2023 – VOTO DE QUALIDADE NO CARF

Outra mudança relevante foi promovida no âmbito do contencioso administrativo tributário. A Medida Provisória nº 1.160/2023 estabeleceu o retorno do voto de qualidade do Presidente do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF). Nos termos do art. 25, parágrafo 9º, do Decreto nº 70.235/72, este é um cargo ocupado pelos representantes da Fazenda Nacional. Assim, como o seu voto tem o condão de desempatar os julgamentos, os casos em que há empate tendencialmente serão decididos a favor do Fisco, em razão desse “voto duplo”. A aplicação dessa metodologia estava suspensa desde a Lei nº 13.988/2020, que acrescentou o art. 19-E à Lei nº 10.522/2002, estabelecendo que, em caso de empate, a resolução seria favorável ao contribuinte.

Ademais, a medida provisória também estabeleceu que “na hipótese de o sujeito passivo confessar e, concomitantemente, efetuar o pagamento do valor integral dos tributos devidos, após o início do procedimento fiscal e antes da constituição do crédito tributário”, não haverá a aplicação da multa de mora e da multa de ofício. Para tanto, é necessário que o sujeito passivo cumpra os requisitos até 30/04/2023. Essa condição é aplicável somente para os procedimentos fiscais iniciados até 12/01/2023, data em que a MPV foi publicada.

 

CONSELHO DE ACOMPANHAMENTO E MONITORAMENTO DE RISCOS FISCAIS JUDICIAIS

No dia 12/01/2023, também foi publicado no DOU (Diário Oficial da União) o Decreto nº 11.379 que instituiu o Conselho de Acompanhamento e Monitoramento de Riscos Fiscais Judiciais para discutir medidas de aprimoramento da governança do acompanhamento de riscos fiscais e judiciais da União. O Conselho é formado por um colegiado consultivo que incentivará a adoção de alternativas para fortalecer e subsidiar as atividades realizadas por órgãos, de representação judicial da União, a fim de evitar prejuízos nas contas públicas, preservando a previsibilidade e a segurança na condução da gestão fiscal.

Dentre as competências do colegiado, destacam-se a responsabilidade pela propositura de estratégias de aprimoramento e atualização de procedimentos para identificação de passivos contingentes de demandas judiciais.

Ainda sobre as competências, o colegiado tem o dever de elaborar estudos sobre os riscos fiscais, indicando possíveis fatores motivadores de litigiosidade, com a finalidade de propor ações para a prevenção e a resolução, inclusive incentivando a autocomposição, em lides envolvendo o Poder Público.

Em relação à composição do Conselho, o Decreto nº 11.379 estabelece a participação da Advocacia-Geral da União, do Ministério da Fazenda e do Ministério do Planejamento e Orçamento. A equipe poderá ainda criar grupos temáticos e comissões que apresentarão propostas ao Conselho. Este Decreto entrará em vigor apenas no dia 24/01/2023.

 

Para o nosso sócio nominal, Onofre Batista, “as medidas não nos surpreendem, visto que é realmente necessário fazer frente aos gastos assumidos e buscar o equilíbrio nas contas públicas. Contudo, lamentamos que a forma pela qual tenha se decidido implementar este objetivo represente prejuízo aos direitos dos contribuintes em relação a alguns aspectos.

A exclusão do ICMS da base de cálculo dos créditos do PIS/Cofins contraria a recente IN 2.121/2022 e viola gravemente a segurança jurídica, considerando que, além da Receita Federal, a PGFN também já havia se manifestado em sentido contrário a esta mudança. Essa questão não foi objeto da decisão do STF em Repercussão Geral. Outro ponto de relevo é a restauração do voto de qualidade.

Fernando Haddad, ministro da Fazenda, atribui ao desempate pró-contribuinte uma perda anual de R$ 60 bilhões em arrecadação. Cabe ressaltar, contudo, que o conselho administrativo não é órgão com função de arrecadação, e sim de revisão dos lançamentos realizados pela RFB. A medida tende a aumentar o contencioso judicial, visto que os casos em que há empate, em razão de relevante controvérsia, serão levados para o Judiciário”.

Ele complementa que, em relação ao PRLF, “as condições aplicáveis devem ser analisadas pormenorizadamente, a fim de identificar se a adesão é realmente benéfica. Se houver fundamentos robustos para a defesa quanto ao débito em aberto, pode ser mais interessante tomar outras providências para afastar a exação”.

O Coimbra, Chaves e Batista encontra-se à disposição para esclarecimentos e assessoria.