Em recente artigo publicado pelo Diário do comércio, o sócio fundador do CCBA e membro Conselheiro da regional do Capitalismo Consciente em Belo Horizonte, Paulo Roberto Coimbra opina sobre as duas faces do capitalismo. Confira abaixo.

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Alvo de ataques repletos de alta carga axiológica, o capitalismo tem recebido diversos adjetivos inadequados. Adjetivar o capitalismo, no mais das vezes, não se revela adequado porque dignos de tais qualificações, boas ou ruins, são os homens e suas condutas, e não o sistema produtivo. Enquanto ferramenta ou metodologia de produção, o sistema capitalista não é aprioristicamente bom ou mau, mas detém notável potencial para realizar o bem ou o mal em escalas relevantes e crescentes. Cosméticos são bons ou ruins? E bebidas, são boas ou ruins? Ao sintetizar as mais variadas respostas a conclusão provavelmente será: depende de quem usa… da forma e da intensidade que é utilizada…

“O sucesso não compartilhado é um fracasso”. Em livre tradução, essa é uma frase marcante que pode ser extraída do filme Good Fortune (2017), que retrata a notável trajetória de John Paul Dejoria, fundador das empresas The Paul Mitchel Systems e El Patrón.

Algo similar pode se dizer em relação ao capitalismo. Quem é bom ou ruim não é o sistema de produção, mas sim o ser humano que o maneja. Para alguns protagonistas, a exemplo de Dejoria, pode ser uma fonte de riquezas compartilhadas com diversos partícipes de uma atividade econômica consciente e atenta ao seu redor, influenciando positiva e reciprocamente seus stakeholders. Para outros, pode servir como fonte de vil acumulação de riquezas de poucos em detrimento dos interesses dos demais. Portanto, as críticas desferidas ao capitalismo (assim como eventuais elogios) muitas vezes seriam mais bem direcionadas aos seus protagonistas. O ser humano pode ser bom ou mau. Suas escolhas e condutas também podem (e devem) ser alvo de juízo de valor. Contudo, os instrumentos por ele manejados e seus resultados revelam pouco mais do que seu caráter, propósitos e escolhas.

Enquanto metodologia de produção, é induvidosa vocação do sistema capitalista para geração de riquezas. Sua eficiência é boa. Mas pode ser usada para gerar externalidades positivas ou negativas. Ao depender de mercados, quando manejado de maneira consciente, acaba por formá-los e preservá-los.

A despeito de poder gerar resultados extremamente positivos, quando inspirado por propósitos exclusivamente egoísticos, as consequências do capitalismo podem ser nefastas. Apesar de tender à supressão do trabalho escravo, as primeiras revoluções industriais foram marcadas pelo abuso de poder do capital sobre o trabalho. Deste conflito emergiram e se consolidaram direitos sociais, que limitam e direcionam a forma de organização e atuação das forças econômicas.

Contudo, ainda hoje o sistema capitalista pode promover acentuados níveis de desigualdades sociais e econômicas. Segundo estudo da Oxfam International, divulgado às vésperas do Fórum Econômico Mundial de 2020, em Davos, o crescimento do abismo de desigualdade que segrega os (poucos) muito ricos e os (muitos) muito pobres tem minado a luta contra a pobreza, prejudicando a economia e despedaçando os tecidos sociais. Os dados da pesquisa são superlativos e preocupantes.

Sem sombra de dúvidas, muitos erros e acertos marcam a história nos mais diversos campos. Mas, mesmo sem otimismo ingênuo, podem ser identificados amadurecimentos positivos no tortuoso percurso da humanidade, tendentes à construção de um mundo melhor para um número cada vez maior de pessoas. Na busca de identificar e compreender a necessária evolução do capitalismo, Paul Collier destaca, com atino, que “para funcionar para todos, o capitalismo precisa ser gerido de forma que traga não só produtividade, mas também propósito” e conclui que “o capitalismo precisa ser administrado, não derrotado” e que “o futuro das nossas sociedades depende não da derrubada, mas sim da reforma do capitalismo” (O Futuro do Capitalismo: enfrentando novas inquietações, 2019).

Buscando sintetizar os propósitos mais relevantes na atualidade, em 2012, a ONU instituiu 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para direcionar a agenda dos entes públicos e privados na superação dos maiores desafios do nosso tempo, cuidar do planeta e melhorar a vida de todos. Dentre eles destaca-se a ODS 12: consumo e produção responsáveis. Pode-se compreender, que somente com o consumo e produção conscientes poderemos alcançar um mundo melhor.

Muito além do pagamento de impostos e respeito à legislação trabalhista, a adoção de métodos e medidas de produção consciente devem ser eleitos como fatores decisivos de escolha e preferências do consumidor. Assim, para a manutenção e conquista de novos consumidores, os agentes econômicos terão suas escolhas e decisões induzidas, conduzindo a resultados benéficos para todos.

Eis o poder do consumo consciente, que pressupõe educação e transparência. A jornada é longa, mas parece ser o caminho mais certo e seguro para o futuro da humanidade.

 

Fonte: www.diariodocomercio.com.br