Em 25/09/2023, foi publicado o acórdão do julgamento do Recurso Especial n. 2.088.361, no qual a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu pela ilegalidade do art. 186 do Decreto 10.854/2021, que limitou a dedução do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) em relação aos trabalhadores que recebem acima de cinco salários-mínimos e ao valor máximo de um salário-mínimo.

O art. 186 do Decreto 10.854/2021 alterou o art. 645 do Regulamento do Imposto de Renda (Decreto n. 9.580/2018), que prevê a dedução do IRPJ sobre a soma das despesas de custeio do PAT, para limitar a sua aplicação aos valores dispendidos com trabalhadores que recebem até cinco salários mínimos. A nova redação também limita a dedução à parcela do benefício que corresponder ao valor de, no máximo, um salário-mínimo.

Nos autos do REsp n. 2.088.361, apreciado pelo STJ, debateu-se a legalidade das alterações promovidas pelo Decreto 10.854/21. O recurso foi interposto pela Fazenda Nacional em face de acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), favorável ao contribuinte. Na ocasião, o TRF-5 reconheceu que o decreto extrapolou sua função regulamentar, contrariando os princípios da estrita legalidade e da hierarquia das leis, e assegurou ao contribuinte o direito à dedução das despesas do PAT nos termos da Lei n. 6.321/76, sem a aplicação da restrição imposta pelo decreto.

Recorde-se que a Lei n. 6.321/76 possibilita a dedução em dobro das despesas comprovadamente realizadas no período de apuração com o programa de alimentação do trabalhador (PAT) do lucro tributável, para fins de apuração do IRPJ, desde que essa dedução não ultrapasse 5% do lucro tributável. Posteriormente, o limite de dedução isolado foi alterado para 4%, por meio da Lei n. 9.532/97.

Após a decisão favorável ao contribuinte, o caso foi submetido à análise do STJ, devido à interposição de recurso pela Fazenda Nacional. Em suas razões recursais, argumentou-se que o objetivo do PAT é melhorar as condições nutricionais dos trabalhadores, em especial os de baixa renda, a fim de lhes garantir a alimentação adequada por meio da concessão de incentivo fiscal aos empregadores.

Além disso, a Procuradoria da Fazenda defendeu a observância do princípio da legalidade tributária sob o fundamento de que a atuação do Poder Executivo observou aos limites, autorizados pelo Poder Legislativo, para estabelecer regras que garantam o atendimento prioritário dos trabalhadores de baixa renda, conforme redação dos artigos 1° e 2° da Lei 6.321/76.

Os Ministros firmaram o entendimento de que o art. 186 do Decreto 10.854/21, ao restringir a dedução do PAT aos valores pagos a título de alimentação para os trabalhadores que recebam até cinco salários-mínimos, limitada a dedução ao valor de, no máximo, um salário-mínimo, incorreu em ilegalidade. Isso porque essas limitações para a dedução não constam expressamente nas leis criadoras do PAT e não poderiam ser estabelecidas por meio de decreto regulamentar, pois falta autorização legal específica para tanto. Assim, negaram provimento ao recurso especial interposto pela União, mantendo inalterado o acórdão proferido em segunda instância.

Para o nosso sócio, Guilherme Bagno, “a decisão do STJ foi acertada, na medida em que admitir que um Decreto alterasse as regras balizadoras do PAT instituídas em Lei, além de ferir o princípio da legalidade, restaria por reduzir o incentivo para as empresas que respeitam as regras do programa e auxiliam o Estado no desenvolvimento de programas sociais, em especial a alimentação do trabalhador, resguardando-se, assim, a segurança jurídica aos contribuintes”.