Em recente artigo, publicado pelo Diário do Comércio, Paulo Coimbra, nosso sócio, conselheiro e embaixador do Instituto Capitalismo Consciente Brasil (regional BH), comenta sobre a Participação nos Lucros e/ou Resultados (PLR) e sua relação com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), apoiados pela Organização das Nações Unidas (ONU). Leia a seguir:

 

 

No filme Good Fortune (2017), que relata a inspiradora trajetória de J. P. Dejoria, empresário e filantropo, fundador das bem-sucedidas empresas The Paul Mitchell Systems e El Patrón, encontramos uma consciência refinada na feliz e sintética frase de seu protagonista: Unsharedsuccessisfailure. Em uma tradução livre: o sucesso não compartilhado é um fracasso.

Antes que a sopa de letrinhas no título assuste os leitores menos afetos aos acrônimos tão presentes no mundo corporativo atual, esclareça-se que cuidaremos nesta coluna da Participação nos Lucros e/ou Resultados (PLR) das empresas e sua íntima relação com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) abraçados pela ONU.

Em setembro de 2015, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou 17 (dezessete) objetivos globais específicos que condensam os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs), cujo intuito é mobilizar a humanidade na busca dos propósitos ratificados na Agenda 2030.

Dentre tais objetivos, abraçados por 193 países, destacam-se dois: (i) ODS 01: erradicação da pobreza – acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares; e (ii) ODS 10: redução das desigualdades – reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles.

Segundo estudo da rede de organizações não governamentais Oxfam International, divulgado às vésperas da abertura do Fórum Econômico Mundial de 2020, em Davos, o crescimento do abismo de desigualdade que segrega os (poucos) muito ricos e os (muitos) muito pobres tem minado a luta contra a pobreza, prejudicando a economia e despedaçando os tecidos sociais. Os dados são superlativos e preocupantes. Dentre as tristes constatações do mencionado estudo, destacam-se, a excessiva concentração de riquezas, a má distribuição da carga fiscal decorrente de modelos de tributação regressiva sobre o consumo e a desigualdade de gênero no mercado de trabalho. Sem rodeios, a pesquisa denuncia haver mais bilionários do que nunca, atingindo suas fortunas novos recordes. Esse seleto grupo (de bilionários) possui, atualmente, mais riqueza do que 4,6 bilhões de habitantes (o que corresponde a 60% da população mundial). O 1% mais rico de nosso planeta possui mais do dobro da riqueza de 6,9 bilhões de pessoas, enquanto aproximadamente 735 milhões de pessoas vivem na extrema pobreza, segundo a Oxfam International.

Nesse contexto, refulge a importância dos ODSs 1 e 10, cujos desafios não são novos e, por isso, refletem valores e objetivos já adotados por diversos países, calcados na dignidade da pessoa humana, na erradicação da miséria e na redução da desigualdade. No Brasil, a Constituição de 1988, já em seu artigo inaugural, funda a República Federativa na dignidade da pessoa humana e nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º). Logo mais adiante, ainda em seus dispositivos iniciais, estabelece como objetivos fundamentais da República a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, mediante o desenvolvimento nacional para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, que promova o bem de todos (art. 3º).

É evidente, portanto, o entrelaçamento e a convergência entre as metas acima pinçadas, na medida em que uma melhor distribuição de riquezas e consequente redução das desigualdades (ODS 10) poderia contribuir decisivamente para a erradicação da pobreza (ODS 1). Igualmente, na vigente Constituição Brasileira, a interdependência simbiótica entre tais objetivos se revela evidente em sua redação conjunta, compondo ambos um único inciso de seu art. 3º, deixando transparecer que ambos devem ser perseguidos conjuntamente, sob pena de nenhum deles ser alcançado. Trata-se, pois, de uma busca única.

Para o seu alcance, a Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/1988), em seu art. 7º, XI, erige, dentre outros, o direito social dos trabalhadores à PLR (Participação nos Lucros e/ou Resultados), desvinculada da remuneração. Trata-se, pois, de valioso instrumento constitucional de fomento a um capitalismo consciente e humanista, apto a contribuir para uma melhor distribuição de riqueza no Brasil. Mediante o desejável alinhamento de interesses e pacificação entre os elementos históricos de produção (capital e trabalho), devidamente estimulada, poderia (e deveria) a PLR converter-se em preciosa ferramenta contributiva para a consecução dos mais elevados propósitos de nossa República, bem como aos objetivos acima destacados e recentemente abraçados pela humanidade.

Empresas que desejam cumprir sua relevante função social, abraçando sua responsabilidade na construção de uma sociedade mais justa e igualitária, e prestar sua necessária contribuição para a “Agenda 2030” estabelecida pela ONU, não precisam buscar fórmulas mirabolantes e dispendiosas. Além de oferecerem salários dignos, podem e devem instituir programas de participação de seus colaboradores nos seus lucros e resultados, de forma a com eles compartilhar parte do sucesso alcançado. E assim viverem a experiência de relações com melhor alinhamento de interesses, maior produtividade e satisfação nos ambientes de trabalho.