No dia 18/01/2022, a 3ª Vara Federal de Santo André concedeu a segurança pretendida pelo contribuinte para excluir os valores pagos a título de remuneração a aprendiz da base de cálculo da contribuição previdenciária patronal (CPP); da contribuição para financiamento de benefícios decorrentes de riscos ambientais do trabalho (RAT); e das contribuições devidas a terceiras entidades. A sentença ainda reconheceu o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente nos últimos cinco anos, corrigidos pela Selic.
As origens do “contrato de aprendizagem” remontam ao Decreto-Lei 2.318/86, que regulamenta de forma específica “as fontes de custeio da Previdência Social e a admissão de menores nas empresas”. A norma foi categórica ao determinar que os valores despendidos pelas empresas para custear os contratos com menores aprendizes não estão sujeitos a encargos previdenciários de qualquer natureza, nem mesmo a recolhimento em favor do FGTS. O referido dispositivo foi regulamentado pelo Decreto-Lei 94.338/87, que instituiu o chamado “Programa do Bom Menino” e foi posteriormente revogado pelo Decreto s/nº de 10 de maio de 1991.
Ocorre que, apesar da revogação do decreto regulamentador, o próprio Decreto-Lei 2.318/86, consagrador de isenção tributária, jamais se sujeitou a qualquer modalidade de revogação no que é pertinente ao afastamento de encargos previdenciários eventualmente incidentes sobre a remuneração de menores admitidos nas empresas como aprendizes. Isto posto, no tocante à Constituição da República de 1988, aplica-se o instituto da recepção, segundo o qual toda a legislação vigente no momento da edição da carta magna foi recepcionada, desde que não contrarie os dispositivos constitucionais.
Portanto, sustenta-se a recepção do Decreto-Lei 2.318/86 pela CRFB/88, por tratar de programa cujo objetivo é assegurar o direito à profissionalização de adolescentes e jovens, em perfeita harmonia com as normas constitucionais expressas no art. 7º, XXXIII, e no art. 227, caput, da CRFB/88.
Como se depreende da Consolidação das Leis do Trabalho, em seu art. 428, o contrato de aprendizagem é um contrato de natureza especial. Isso significa que, justamente por sua excepcionalidade, ele não está sujeito às mesmas condições dos contratos que efetivamente envolvem relação de trabalho. Embora a legislação trabalhista não tenha previsões acerca da (não) incidência de contribuições previdenciárias sobre a remuneração paga aos aprendizes (o que é natural, pois não seria mesmo de sua competência), a incorporação do programa de aprendizagem na legislação trabalhista apenas reforça a importância que assume em nosso ordenamento jurídico o direito à profissionalização de adolescentes e jovens.
A sentença da 3ª Vara Federal de Santo André reconheceu a recepção do Decreto-lei nº 2.318/86 e, com base nisso, afirmou que a regra isentiva prevista pelo art. 4º do referido Decreto-lei permanece incólume. Reconheceu que a norma constitui, verdadeiramente, um fomento à contratação de aprendizes, sendo indevida a incidência das contribuições sobre os valores pagos a eles. O magistrado ainda colacionou precedente do STJ (REsp 1.599.143) que confirma o entendimento, isto é, que reconheceu o caráter não empregatício do vínculo do menor aprendiz com a empresa e, consequentemente, a inexistência do dever de recolhimento de contribuições.
A sócia do CCBA, Alice de Abreu Lima Jorge, ressalta que a sentença proferida por uma das varas do TRF3 é de grande relevância por resguardar o direito fundamental dos jovens ao trabalho. “Ao reconhecer a não incidência de contribuições sobre valores pagos a aprendizes, a decisão colabora para que o objetivo da norma (e da CRFB/88) seja alcançado: o incentivo à contratação de jovens e adolescentes por parte das empresas. Os empregadores colaboram de maneira relevante para a concretização das políticas públicas de garantia de direitos fundamentais e, por previsão legal, devem ser desonerados no cumprimento desse papel. O valor social do trabalho é um dos fundamentos da nossa República Federativa. A aplicação da legislação tributária, de forma constitucionalmente adequada, demanda que seja adotada a interpretação que propicie a máxima eficácia aos direitos fundamentais. Ficamos felizes que esse entendimento tenha prevalecido na decisão da 3ª Vara Federal de Santo André em processo patrocinado pelo CCBA.”