Em 26/10/2023, foi publicada a Portaria RFB 371/2023, que instituiu a primeira Câmara Recursal do Centro de Julgamento de Penalidades Aduaneiras (Cejul). Esse órgão colegiado é composto por membros da Quinta Turma de Julgamento da Delegacia de Julgamento da Receita Federal do Brasil da 2ª Região Fiscal (DRJ02) e julgará impugnações e recursos relativos à aplicação de multas e penas de perdimento de mercadorias, veículos e moeda.

A criação da primeira Câmara Recursal do Cejul resulta das modificações no Decreto-Lei 1.455/1976 pela Lei 14.651/2023, que introduziu uma segunda instância administrativa para julgar recursos atinentes a penalidades aduaneiras, destacadamente em casos que envolvem a pena de perdimento, a sanção de maior gravidade na seara aduaneira. Até então, decisões sobre essa matéria eram tomadas em instância única pelos delegados da Receita Federal, de modo que não havia possibilidade de recurso.

Com base nessa nova legislação, o Ministério da Fazenda publicou a Portaria Normativa 1.005/2023, que cria o Centro de Julgamento de Penalidades Aduaneiras (Cejul), no âmbito da Receita Federal do Brasil (RFB). A finalidade do órgão é julgar as impugnações e recursos protocolados em processos administrativos que envolvam penalidades aduaneiras. Conforme dispõe a citada Portaria, as deliberações da Câmara Recursal serão tomadas por maioria simples, e caberá ao Presidente o voto de qualidade.

O Cejul será chefiado por um Auditor-Fiscal e será constituído por três componentes: a Equipe Nacional de Julgamento (Enaj), encarregada do julgamento de primeira instância; as Câmaras Recursais, responsáveis pelo julgamento de segunda instância; e o Serviço de Controle de Julgamento de Processos de Penalidades Aduaneiras (Sejup). Cada Câmara Recursal deverá sempre contar com pelo menos três e no máximo cinco julgadores, liderados por um presidente eleito dentre esses julgadores.

É competência do Secretário Especial da RFB designar os chefes da Cejul, da Enaj e do Sejup, bem como os presidentes das Câmaras Recursais. Ademais disso, segundo consta na Portaria Normativa MF 1.005/2023, a escolha dos julgadores, que é atribuição do Subsecretário de Tributação e Contencioso da Secretaria Especial da RFB, deverá considerar dois critérios: (i) experiência profissional; e (ii) formação acadêmica dos Auditores-Fiscais da RFB.

Além da criação da primeira Câmara Recursal, a recém editada Portaria RFB 371/2023 também instituiu duas Turmas Especiais vinculadas à Quinta Turma ordinária da DRJ02. A criação de turmas especiais como essas é autorizada pela Portaria MF 20/2023 e, nesse caso, ambas serão incumbidas de apreciar em primeira instância, por meio de decisão monocrática, as impugnações apresentadas pelos sujeitos passivos contra as penas de perdimento e multas aplicadas em seu desfavor. Nota-se, ainda, conforme a Portaria Normativa 1.005/2023, que o  Enaj, as Câmaras Recursais e o Sejup irão operar em formato virtual e serão estabelecidos por meio de ato do Secretário Especial da Receita Federal do Brasil.

Para o nosso sócio, Onofre Batista, “em tese, a criação de instâncias recursais no sistema aduaneiro brasileiro visa aprimorar a transparência e a justiça no processo de julgamento de penalidades. No entanto, preocupações exsurgem no que diz respeito à conformidade do Cejul e de suas câmaras recursais aos padrões internacionais ratificados pelo Brasil. Em março de 2020, o Brasil promulgou a Convenção de Quioto Revisada (CQR/OMA), que assegura o direito de recurso a uma “autoridade independente da administração aduaneira”. No entanto, o Cejul, como um todo, não se ajusta a essa previsão da CQR, pois seus membros, inclusive das câmaras recursais, integram a administração fazendária (que também é a aduaneira), em contraponto à noção de independência apregoada pela Convenção. A Portaria RFB 371/2023, nesse sentido, não deixa de ser um começo, embora tímido. O princípio do interesse nacional vincula o Direito Aduaneiro, mas há ainda o Princípio da Integração, reforçado no pacto de Quioto (CQR/OMA) e o dever de celeridade, eficiência, justiça, estrita legalidade etc. A visão unilateral, por mais bem intencionada que possa ser (e usualmente é), pode levar a um desequilíbrio na busca da solução equilibrada mais acertada. Por isso, a oxigenação proporcionada pelos contribuintes acaba sendo importante em órgãos julgadores. O órgão criado é, assim, menos “julgador” e mais “conformador às diretrizes superiores”, sem independência adequada para seus membros. Entendo esse como um primeiro e singelo passo… mas ainda falta muito!”