A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em sessão realizada em 06 de fevereiro de 2025, firmou tese no Tema Repetitivo n. 1.290/STJ segundo a qual os valores pagos às empregadas gestantes afastadas, inclusive às que não puderam trabalhar remotamente, durante a pandemia de COVID-19, possuem natureza de remuneração regular, a cargo do empregador, não se configurando como salário-maternidade para fins de compensação. O STJ decidiu, ainda, que nas ações relacionadas à matéria, a legitimidade passiva ad causam recai sobre a Fazenda Nacional, e não sobre o INSS.

A Lei n. 14.151/2021 estabeleceu que as empregadas gestantes, integrantes do grupo de risco durante a emergência de saúde pública decorrente do coronavírus, deveriam ser afastadas de suas atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração. Os contribuintes argumentaram que a referida Lei teria sido omissa quanto à responsabilidade pelo pagamento da remuneração no período referente ao afastamento, principalmente quando o trabalho remoto não é compatível com as atribuições do cargo.

De acordo com o argumento dos contribuintes, tais valores se enquadram  como salário-maternidade a ser arcado pela Previdência Social, a partir da autorização para que o empregador realize a compensação quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos, nos termos dos artigos 71 e 72, § 1º, da Lei n. 8.213/1991.

A Fazenda Nacional, por outro lado, alegou que os pagamentos realizados durante o afastamento da empregada gestante não se enquadram na hipótese prevista nos referidos dispositivos legais. Isso porque o art. 71 estabelece a previsão de que o salário-maternidade será concedido à segurada gestante durante 120 dias, com início no período entre 28 dias antes do parto e a data de ocorrência deste, não podendo ser percebido antes de seu termo inicial ordinário.

Conforme o argumento fazendário, a única exceção seria aquela contida no § 3º do art. 394-A da CLT, segundo a qual, quando não for possível que a gestante afastada de atividades insalubres exerça suas funções em local salubre na empresa, a hipótese será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade. Diante disso, sustentou a Fazenda que a situação prevista na Lei n. 14.151/2021 não poderia, por analogia, ser tratada como aquela prevista na CLT.

Todavia, face ao risco para a gravidez ocasionado pela pandemia de COVID-19, os contribuintes alegaram que, nas hipóteses de impossibilidade de exercício das atividades por meio de teletrabalho, em razão de as funções desempenhadas serem exclusivamente presenciais, os pagamentos devem ser enquadrados como salário-maternidade, nos termos da CLT. Ainda, reforçam a argumentação com base na inexistência de contraprestação de serviço, bem como no fato de a trabalhadora não estar à disposição do empregador, nos casos em que não foi possível o trabalho à distância.

No entanto, o STJ definiu que a Lei n. 14.151/2021 atribuiu a responsabilidade pelo pagamento dos salários das empregadas afastadas do trabalho ao empregador, de forma expressa e inequívoca. Para o Tribunal, a possibilidade de pagamento de salário-maternidade para empregadas gestantes cujas atividades fossem incompatíveis com o trabalho remoto, matéria objeto de veto presencial, corresponderia a indevida ampliação de benefício previdenciário, acarretando prejuízo à disciplina fiscal face à ausência de fonte de custeio equivalente.

De acordo com voto do Relator, Min. Gurgel de Faria, o referido diploma legal estabeleceu modificação extraordinária no modo de execução do contrato de trabalho, e não sua suspensão ou interrupção. Dessa forma, dada a excepcionalidade do período de pandemia, firmou-se o entendimento de que a legislação impôs aos empregadores a obrigação de manter o pagamento dos salários das gestantes afastadas, com a finalidade de resguardar a saúde dessas trabalhadoras.

O Supremo Tribunal Federal manifestou entendimento de acordo com o qual a matéria não possui repercussão geral, segundo o fundamento de que seria “infraconstitucional a controvérsia sobre a natureza da remuneração paga à empregada gestante afastada das atividades de trabalho durante a emergência de saúde pública do COVID/19 para fins de compensação com as contribuições devidas pelo empregador”, conforme Tema n. 1.295/RG. Por isso, há uma tendência de que a decisão de mérito desfavorável aos contribuintes proferida pelo STJ prevaleça.

De acordo com Paulo Coimbra, sócio CCBA, “a lei não definiu expressamente a quem caberia a responsabilidade pelo pagamento desse benefício nos casos de impossibilidade do exercício da atividade laboral a distância. Nesses casos, diante dos notórios riscos causados pela pandemia, reconhecidamente mais elevados para as grávidas, o afastamento destas empregadas do ambiente de trabalho deveria ensejar benefício securitário que proporcionasse condições de sustento à gestante e ao bebê durante a crise sanitária.”

Ademais, Paulo Coimbra complementa que “a proteção à gestante é um dever do Estado constitucionalmente atribuído à Previdência Social (artigo 201, II, CRFB/1988) e à Assistência Social (artigo 203, I, CRFB/1988), o qual deve ser assegurado a todas as brasileiras que se encontrem nessa situação, independentemente do pagamento de tributos previdenciários. Nessa linha, entendemos, com a devida vênia, que a conclusão do STJ no sentido de que esse ônus recaia apenas sobre a empresa empregadora, e não sobre a coletividade, não foi a mais adequada. Imputar às empresas uma obrigação que seria do Estado equivale ao que José Casalta Nabais denomina ‘socialização a frio’, fazendo com que a obrigação salarial se transforme em um genuíno tributo, sem a devida contraprestação estatal, e fundamentado em direitos sociais que, por sua natureza, são deveres do próprio Estado.”

O Coimbra, Chaves & Batista encontra-se à disposição para esclarecimentos e assessoria.