O Presidente da Comissão Gestora de Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) indicou alguns recursos especiais nos quais se discute a incidência de contribuição previdenciária e contribuições destinadas a terceiros sobre a bolsa de jovem aprendiz, para serem afetados ao julgamento sob a sistemática dos recursos repetitivos.

O Programa Menor Aprendiz, ou Jovem Aprendiz, é um instrumento de qualificação profissional para adolescentes e jovens. Por meio desse programa, as empresas tornam-se responsáveis por assegurar uma formação técnico-profissional metódica, compatível com o desenvolvimento físico, moral e psicológico do aprendiz. Já o aprendiz, por sua vez, deve executar, com zelo e diligência, as tarefas necessárias a essa formação. Aos aprendizes é assegurada uma bolsa custeada pela empresa. A Administração Tributária entende que o valor da bolsa paga ao menor aprendiz está sujeito à incidência de contribuições previdenciárias.

Os contribuintes se insurgem contra essa cobrança alegando que o contrato de aprendizagem possui natureza especial, de forma que não estão presentes as mesmas condições que envolvem a relação de emprego; assim os pagamentos realizados aos aprendizes teriam natureza de ajuda de custo – bolsa – e não de salário ou remuneração.

Ademais, argumentam que o art. 4, § 4º, do Decreto-Lei n. 2.318/86 isenta o pagamento realizado a menores aprendizes da incidência de contribuições previdenciárias. Por fim, alegam que os menores não são segurados obrigatórios do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e, assim, os pagamentos a eles realizados não se sujeitariam à incidência de contribuições previdenciárias patronais que somente incidem sobre a remuneração paga a pessoas físicas seguradas obrigatórias do RGPS.

Por outro lado, A Fazenda Nacional defende que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê que indivíduos maiores de 14 e até 24 anos têm assegurados os direitos trabalhistas e previdenciários, o que implica contrapartidas dos empregadores, incluindo a incidência de contribuições previdenciárias. Ademais, a Fazenda Nacional defende que o art. 4, § 4º, do Decreto-Lei n. 2.318/86 teria sido tacitamente revogado pelo ECA e pela própria CRFB/1988.

O Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre o caráter infraconstitucional da controvérsia sobre a incidência de contribuição previdenciária patronal e de contribuições destinadas a terceiros sobre a bolsa de jovem aprendiz (Tema n. 1.294/RG), de modo que cabe ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) dar a última palavra acerca da matéria.

Os recursos especiais que podem ser afetados como representativos da controvérsia são: REsp n. 2.191.694/SP; REsp n. 2.191.505/PR; e REsp n. 2.191.479/SP.

De acordo com Paulo Coimbra, sócio CCBA, “o Decreto-Lei 2.318/86, ao contrário do que sustenta a Fazenda Nacional, foi recepcionado pela CRFB/1988, por tratar de programa cujo objetivo é assegurar o direito à profissionalização de adolescentes e jovens, em perfeita harmonia com as normas constitucionais insculpidas nos art. 7º, XXXIII, e art. 227, caput, da CRFB/1988”.

Conforme pontua, o Programa Jovem Aprendiz, sucessor do Programa do Bom Menino, visa estimular a contratação de menores, promovendo sua inserção no mercado de trabalho, em alinhamento com o caminho que foi delineado pela Constituição ao adotar o valor social do trabalho como fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, IV, da CRFB/1988). Trata-se de política essencial diante da preocupante realidade do aliciamento de menores pelo crime organizado, que se aproveita da menoridade penal para recrutá-los, induzindo-os à prática criminosa sob a promessa de impunidade.

Nesse sentido, o sócio chama atenção para dados da Fundação Casa, de 2025 (clique aqui), os quais revelam que os jovens recrutados para o tráfico correspondem a 42,11% daqueles que cometem atos infracionais no Estado de São Paulo. Além disso, estudo realizado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro aponta uma relação direta entre a escassez de oportunidades de trabalho formal para jovens de baixa renda e o ingresso de menores na criminalidade.

Por fim, Paulo Coimbra tece críticas ao entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no Tema n. 1.294/RG: “Em nossa opinião, o posicionamento do STF, ao não reconhecer a existência de repercussão geral da matéria, concessa vênia, não foi o mais adequado. A não incidência de contribuições previdenciárias sobre a bolsa paga ao jovem aprendiz tem como objetivo concretizar objetivos constitucionais como o valor social do trabalho enquanto fundamento da República (art. 1º, IV), o direito social ao trabalho (art. 6º), a busca pelo pleno emprego (art. 170) e a proteção de jovens e adolescentes (7º, XXXIII, e art. 227).  

Ademais, a relevância da discussão é evidenciada pelos alarmantes índices de aliciamento de menores ao tráfico de drogas. Esses dados revelam uma verdadeira luta entre a sociedade e o crime organizado pelo gerenciamento do futuro desses jovens, principalmente dos mais vulneráveis, que residem em comunidades carentes e são justamente o público-alvo dos programas, outrora do ‘Bom Menino’ e hoje do ‘Jovem Aprendiz’.

Nesse contexto, tendo em vista que a norma exonerava existia até mesmo antes da Constituição de 1988, com muito maior razão deveria ser mantida, especialmente ao se considerar que, naquela época, não existiam os índices de recrutamento de menores que os estudos atuais infelizmente revelam. Trata-se, portanto, de uma questão de ordem pública da maior relevância, para a qual o STF, enquanto Corte atenta às questões sociais, não poderia ter se distanciado.

Dessa forma, esperamos que a sensibilidade que esteve ausente no STF quando do julgamento do Tema n. 1.294/RG se faça presente no Superior Tribunal de Justiça caso o tema venha a ser afetado ao rito dos repetitivos.”

 

O Coimbra, Chaves & Batista encontra-se à disposição para esclarecimentos e assessoria.