A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu, por maioria, que o Decreto nº 64.213/2019 do Estado de São Paulo, o qual revogou o benefício fiscal de aproveitamento de créditos de ICMS decorrentes de compras de insumos agropecuários isentos do imposto, somente poderia ter entrado em vigência em janeiro de 2020, permitindo o aproveitamento dos créditos constituídos até o final de 2019. A decisão foi proferida no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 1.343.737/SP, em 18/02/2022.

Embora tenha revogado o supracitado benefício fiscal, previsto no art. 41, §3º, do Anexo I, do RICMS de São Paulo, o decreto questionado entrou em vigor no dia seguinte à sua publicação, no dia 1º/05/2019. Diante disso, os contribuintes alegaram, perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), duas teses: (i) a ilegalidade da revogação realizada por meio de decreto, uma vez que deveria ter ocorrido através de lei; e (ii) a violação às regras da anterioridade anual e nonagesimal, que, aplicados cumulativamente, estabelecem que os tributos somente poderão ser cobrados no próximo exercício financeiro de sua instituição ou majoração, e, no mínimo, após 90 dias da data em que tenha sido publicada a lei que institui ou aumenta o tributo, conforme o art. 150, III, “b” e “c”, da Constituição da República (CRFB/1988).

O TJSP havia proferido decisão parcialmente favorável ao contribuinte, determinando que o referido decreto estadual produzisse efeitos somente a partir do ano seguinte à sua edição, observada a anterioridade anual e a noventena, uma vez que a revogação proporcionou aumento de carga tributária. O Estado de São Paulo recorreu dessa decisão perante o Supremo Tribunal Federal (STF), mas a 1ª Turma do STF manteve o acórdão do TJSP. A maioria dos Ministros acompanhou o voto do ministro Roberto Barroso, que divergiu do ministro relator Alexandre de Moraes.

Para o relator, a revogação de benefício fiscal não seria majoração de tributo, não sendo necessária a observância do princípio da anterioridade, conforme havia sido decidido pelo STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.016/PR, em 2018. Naquela ocasião, a Corte julgou que a redução ou a extinção de desconto para pagamento de imposto sob determinadas condições previstas em lei, como o pagamento antecipado em parcela única, não podem ser equiparadas a aumento de tributo. O relator foi acompanhado pela ministra Cármen Lúcia.

Não obstante, o ministro Roberto Barroso sustentou que esse precedente já estaria superado, tendo em vista que a jurisprudência do STF tem se consolidado para reconhecer a necessidade de respeito à anterioridade anual e nonagesimal na hipótese de aumento indireto de tributo, como a revogação de benefício fiscal. A posição foi seguida pelos ministros Rosa Weber e Dias Toffoli.

Alice Jorge, sócia do CCBA, destaca a importância desta decisão: “A decisão da 1ª Turma acompanha o acertado entendimento que vem sendo consolidado pelo STF, no sentido de que a revogação de benefício fiscal constitui majoração indireta do tributo e, por essa razão, deve respeitar os princípios da anterioridade anual e nonagesimal.”

“Todavia, é importante observar que ainda poderá ser objeto de recurso a possibilidade de revogação de benefício fiscal por intermédio de decreto, tendo em vista o Princípio da Legalidade em sentido estrito, que limita o Poder de Tributar do Estado”, ressalva Alice.