Começou no dia 08/10 o julgamento do RE 851.421/DF pelo Supremo Tribunal Federal, cujo o término está previsto para o dia 18/10. No caso é discutida a Lei Distrital nº 4.732/2011, na qual o Distrito Federal suspendeu a exigibilidade de créditos tributários de ICMS oriundos de benefícios fiscais declarados inconstitucionais entre o final dos anos 1990 e início dos anos 2000. O MPDFT discute se poderia o Distrito Federal desistir da cobrança de tributos que anteriormente ele havia isentado, mas cujo benefício foi posteriormente julgado inconstitucional. Para o relator, Min. Luís Roberto Barroso, não haveria incompatibilidade entre a inconstitucionalidade já declarada de um benefício fiscal e a posterior remissão pelo ente tributante dos débitos dos contribuintes que surgiram após o reconhecimento da nulidade desses mesmos benefícios fiscais. O caso aguarda o posicionamento dos demais membros do plenário da corte. 

No final dos anos 1990 e no início dos anos 2000, o Distrito Federal instituiu os programas “PRÓ-DF”, “RAE” e “TARE” na forma sobretudo da Lei nº 2.483/1999, a qual deu uma série de vantagens fiscais e créditos presumidos de ICMS a certos contribuintes de modo a promover desenvolvimento econômico regional e a atrair empresas para o Distrito Federal. No entanto, esses benefícios foram criados unilateralmente e sem convalidação pelos demais Estados-membros. Assim, esses programas seriam declarados, ao longo dos anos 2000, inconstitucionais pelo TJDF e pelo STF.  

Com efeito, pela própria natureza da declaração de inconstitucionalidade, a qual possui eficácia retroativa (ex tunc), todos os tributos que os contribuintes beneficiados não pagaram, por entenderem estarem protegidos pela política fazendária distrital, até então presumidamente constitucional, passaram a ser exigíveis. Como não houve modulação de efeitos, enorme insegurança jurídica se instaurou entre Fisco e contribuintes. A fim de sanar a controvérsia, o Distrito Federal aprovou, em 29 de dezembro de 2011, a Lei nº 4.732, que concedia a remissão dos créditos. Essa medida seria inclusive convalidada pelo Confaz na forma dos Convênios nº 84/2011 e n° 86/2011. 

Todavia, a remissão foi questionada no mandado de segurança nº 2011.00.2.025686-7, que posteriormente chegou no STF a partir do RE 851.421/DF. O caso teria a sua Repercussão Geral reconhecida em 21/05/2015, enquanto ainda estava designado à relatoria do Min. Marco Aurélio Mello. 

Os benefícios fiscais eram inconstitucionais, de modo que os contribuintes não poderiam ter sido favorecidos por eles. A declaração de inconstitucionalidade tornou exigível o crédito tributário. A questão posta em juízo, então, seria se, noutro turno, ao permitir a remissão desses créditos, o Distrito Federal não estaria reiterando a inconstitucionalidade por outros meios. 

Para o novo relator, o Min. Luís Roberto Barroso, esse não seria o caso. Para ele, não haveria inconstitucionalidade, uma vez que os entes possuem autonomia, à luz do federalismo, para deliberarem acerca de sua política fazendária.  

A questão se explica, na realidade, pelo vício que causou a inconstitucionalidade em primeiro lugar. A Lei Complementar nº 24/1975 determina em seu art. 1º que para que uma isenção de ICMS seja considerada legítima, é necessário que ela seja aprovada por convênio em que tenham sido convocados representantes dos demais Estados e do Distrito Federal. Os programas “PRÓ-DF”, “RAE” e “TARE” foram declarados inconstitucionais porque foram instituídos unilateralmente. Todavia, a lei que autoriza a remissão de seus créditos foi convalidada pelos Convênios nº 84/2011 e nº 86/2011, do Confaz.  

Assim, para o Relator, a remissão não seria uma suposta constitucionalidade superveniente declarada pelo legislador ordinário, o que é vedado pela jurisprudência do STF, mas mero exercício das faculdades do Distrito Federal no que tange à sua política fazendária, tendo sido obedecido todos os ritos necessários e estipulados na forma da lei para instituí-la.  

Caso o entendimento do relator prevaleça, será fixada a seguinte tese para o Tema 807 da Repercussão Geral: “é constitucional a lei estadual ou distrital que, com amparo em convênio do Confaz, conceda remissão de créditos de ICMS oriundos de benefícios fiscais anteriormente julgados inconstitucionais”. 

Para José Henrique Guaracy, sócio do CCA, a questão “caminha de acordo com a segurança jurídica, pois impede que o contribuinte seja prejudicado pela cobrança de um tributo que ele supunha estar isento, em razão de um programa estadual presumidamente constitucional”. O advogado destacou ainda que “os programas de incentivos exigiam diversas contrapartidas do contribuinte, de modo que não se poderia alegar que a sua adesão não teria sido sem custo para as empresas. Logo, a decisão impede que sejam impostos ônus injustificados aos contribuintes, especialmente depois de o Confaz ter convalidado os benefícios declarados inconstitucionais.” José Henrique Guaracy reforçou, ainda, que a questão guarda semelhança com a ADI nº 5.902, em que o Estado do Amazonas discute a constitucionalidade da Lei Complementar nº 160/2017. Esta, visava a mitigar a Guerra Fiscal, permitindo a remissão de créditos tributários decorrentes de benefícios fiscais não ratificados em deliberação do Confaz.