O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para julgar a inexistência de questão constitucional com repercussão geral do ARE 1.376.970/PR, leading case do Tema 1.221, em que se discute a incidência de contribuição patronal sobre IRRF e contribuição do empregado e do trabalhador avulso. O encerramento do julgamento está previsto para o final desta semana, em 16/06.

A repercussão geral é um requisito de admissibilidade para o julgamento de Recurso Extraordinário pelo STF, previsto no art. 102, § 3º, da Constituição de 1988 (CRFB/1988) e art. 1.035 do Código de Processo Civil (CPC/2015). Nesse sentido, o recorrente deve demonstrar que as questões constitucionais discutidas no caso são relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, para que a Corte examine o recurso. Ou ainda, o recorrente pode comprovar que a decisão recorrida contraria súmula ou jurisprudência dominante do STF, hipótese na qual a repercussão geral é presumida.

Todavia, o Tribunal poderá recusar a apreciação do recurso se dois terços de seus membros votarem pela ausência de questão constitucional com repercussão geral, através do Plenário Virtual. É o que vem ocorrendo no julgamento em comento. Até o momento, nove ministros já votaram pela ausência de questão constitucional com repercussão geral, no mesmo sentido da manifestação do Ministro Presidente Luiz Fux, relator do caso.

Para o ministro relator, a análise da possibilidade de exclusão dos valores relativos ao Imposto de Renda e à Contribuição Previdenciária, retidos na fonte pelo empregador, da base de cálculo da contribuição previdenciária patronal e destinadas ao SAT/RAT e a terceiros, demandaria a interpretação da legislação infraconstitucional, em especial à Lei 8.212/1991, o que seria inviável em sede de Recurso Extraordinário. Nesse compasso, o relator propôs a tese de que tal matéria teria natureza infraconstitucional, aplicando-lhe os efeitos da ausência de repercussão geral.

Simultaneamente ao Recurso Extraordinário, a recorrente havia interposto o Recurso Especial 1.983.567/RS, perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ). No entanto, o Ministro Sérgio Kukina havia negado provimento ao recurso, monocraticamente, por entender que o acórdão recorrido estaria em consonância com o entendimento do STJ.

No último mês, a 1ª Turma do STJ apreciou o tema de forma colegiada pela primeira vez, ao julgar o AgInt REsp 1.951.995/RS. Na oportunidade, os ministros, por unanimidade, entenderam que os valores retidos de Imposto de Renda e de contribuição previdenciária a cargo do empregado integrariam a base de cálculo da contribuição previdenciária patronal, sob o fundamento de que teriam natureza remuneratória.

Nos termos do voto do relator, desembargador convocado Manoel Erhardt, restou decidido que a base de cálculo da contribuição previdenciária patronal deveria ser a remuneração bruta, e não a remuneração líquida. Além disso, o relator afastou o argumento do contribuinte de que o STF decidiu pela impossibilidade de incidir tributo sobre tributo, ao apreciar a exclusão o ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins, no julgamento do Tema 69 de Repercussão Geral.

Assim, a 1ª Turma acompanhou o entendimento já consolidado pela 2ª Turma do STJ, ao apreciar questão idêntica no julgamento do REsp 1.902.565/PR, de relatoria da Ministra Assusete Magalhães, noticiada em nosso site.

O sócio do CCBA, Paulo Coimbra, destaca a incongruência do entendimento que vem sendo firmado pelos Tribunais, haja vista que exigir a contribuição patronal sobre valores retidos a título de CPS e IRRF é fazer incidir tributo sobre base de cálculo não prevista pela legislação vigente: “A regra matriz constitucional da hipótese de incidência das contribuições sociais outorga a competência da União para tributar tão somente ‘a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício’, conforme previsto no art. 195, I, “a” da Constituição”.

“Ocorre que os valores retidos na folha de salários a título de tributo não representam rendimentos do trabalho e tampouco são pagos ou creditados aos trabalhadores. Diante disso, tais valores não estão abrangidos pela hipótese de incidência das contribuições sociais”, explica.

Paulo acrescenta: “Como destacado pelos professores Thomas Nigel e Liam Murphy, em seu já clássico “O Mito da Propriedade”, somente pode existir propriedade após o pagamento dos tributos. O pagamento de tributo, portanto, per si, não revela capacidade contributiva apta a atrair a incidência tributária, pois os signos presuntivos de riqueza somente podem e devem ser considerados após a dedução dos tributos devidos”.

Por essa razão, Paulo Coimbra entende que essa controvérsia deveria ter sido analisada pelo STF: “A discussão não pode se afastar da regra matriz constitucional e da aplicação do princípio da capacidade contributiva às contribuições, cuja imperatividade já foi reconhecida pelo STF em sede de Repercussão Geral, especialmente em relação àquelas incidentes sobre a folha de pagamentos, ao julgar o AC 1.109/SP MC, a respeito da contribuição adicional sobre a folha devida pelas instituições financeiras. Da mesma forma, não são raras as decisões proferidas pelo STF quanto ao alcance da regra matriz constitucional de incidência dos tributos, o que também deveria ser apreciado pela Corte no Tema 1.221.”