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Refis da crise em julgamento no STJ. Ministros avaliam forma de cálculo dos descontos oferecidos aos contribuintes no âmbito do programa conhecido como Refis da crise, instituído em 2009. Em entrevista para o portal Legislação & Mercados, nosso sócio Paulo Coimbra comenta sobre o assunto. Leia no recorte abaixo:

Está sob julgamento dos ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a forma de cálculo dos descontos oferecidos aos contribuintes no âmbito do programa conhecido como Refis da crise, instituído em 2009. A discussão gira em torno da cobrança de juros de mora sobre multas que haviam sido perdoadas na adesão ao parcelamento previsto no programa.

Na avaliação de Paulo Coimbra, sócio do Coimbra & Chaves Advogados, há uma questão relativa à redação da lei. “Ela não distinguiu, com a clareza desejável, se essa redução de 45% relativa aos juros atingiria todo o crédito tributário, incluindo aí os juros moratórios relativos ao não pagamento das multas, ou seria referente apenas à obrigação principal, isto é, o valor do tributo”, destaca.

Por enquanto o placar no STJ é favorável ao fisco, numa maioria de quatro votos a dois. Mantida essa maioria, ficariam mantidas as condições de cobrança no Refis da crise. Em contrapartida, se houver uma virada, os contribuintes podem alcançar a possibilidade de pleitear a restituição de valores pagos indevidamente. Além disso, será possível a extensão do novo entendimento a outros programas de parcelamento, com prejuízos ainda maiores para o fisco. Faltam quatro votos para a conclusão do julgamento.

Importante lembrar, ressalta Coimbra, que há prescrição em curso. “Somente seriam recuperáveis os valores efetivamente pagos, a título de juros sobre as multas anistiadas, nos últimos cinco anos”, afirma.

A seguir Coimbra discute outros aspectos desse programa de recuperação fiscal.

 

Os ministros do STJ estão analisando a forma como devem ser calculados os descontos no âmbito do chamado Refis da crise. O que está sendo julgado na corte?

O Refis da crise (Lei 11.941/09), dentre outras disposições, estabelece que o contribuinte optante pelo pagamento à vista de débito fiscal será beneficiado com redução de 100% do valor das multas de ofício e de 45% dos juros de mora. A redação da lei, que poderia ter sido mais clara, enseja a seguinte dúvida: a redução de 100% sobre as multas seria aplicável ao seu consectário, a saber, juros sobre as multas — e, nessa toada, a redução de 45% seria cabível aos juros computados sobre o valor do principal (valor do tributo) — ou os juros incidentes sobre as multas seriam reduzidos em 45%?

Portanto, a lei não distinguiu, com a clareza desejável, se essa redução de 45% relativa aos juros atingiria todo o crédito tributário, incluindo aí os juros moratórios relativos ao não pagamento das multas, ou seria referente apenas à obrigação principal, isto é, o valor do tributo.

Está posta em discussão no STJ a definição do percentual de descontos aplicável aos juros de mora incidentes sobre as multas. Para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), o montante de descontos aplicáveis aos juros de mora relativos às multas seria de 45%. Para o contribuinte que ingressou no Judiciário, o montante seria de 100%.

Na nossa opinião, é necessário relembrar que, não havendo mais multa de ofício a se pagar, mercê do desconto de 100%, não faria qualquer sentido a cobrança de juros. A bem da verdade, de acordo com as regras rudimentares da matemática, juros sobre nada seriam nada.

Juridicamente, há de se recordar que, na esteira do brocardo jurídico accessonum sequitur suum principale — ou seja, o acessório segue o principal. A manutenção do pagamento dos juros configuraria a criação de uma nova figura de juros exigíveis isoladamente, o que constituiria uma aberração e contrassenso jurídico.

O contribuinte obteve decisões favoráveis em primeira e segunda instâncias e também na Primeira Turma do STJ. A PGFN interpôs recurso contra essa última decisão, sob o fundamento de haver divergência de entendimento entre a primeira e a segunda turmas do tribunal, e o caso foi levado a julgamento à Primeira Seção do STJ, onde se reúnem os ministros de ambas as turmas. O placar do julgamento está atualmente em 4 a 2, favoravelmente à União, faltando os votos de quatro ministros para conclusão do julgamento.

 

Em linhas gerais, no que consistia o Refis da crise?

O Refis da crise representou uma oportunidade para o acerto de contas entre os contribuintes não adimplentes (inclusive, alcançando o saldo remanescente de débitos consolidados em parcelamentos especiais anteriores). Basicamente, tratou-se de um programa especial de parcelamento e anistia de créditos tributários e seus consectários, publicado em 2009. No contexto da crise de 2008, teve como propósito amortecer os efeitos econômicos negativos do cenário então vivenciado e oferecer uma oportunidade para contribuintes quitarem seus débitos com o fisco e restabelecerem sua regularidade perante o fisco.

Qual tende a ser o impacto da decisão do STJ, considerando os interesses de contribuintes e União?

Caso o julgamento conclua não serem devidos os juros de mora sobre as multas de ofício, os contribuintes que aderiram ao Refis da crise poderão obter no Judiciário requerendo-se a repetição do indébito relativo aos juros de mora sobre as multas de ofício. Importante lembrar que há prescrição em curso. Somente seriam recuperáveis os valores efetivamente pagos, a título de juros sobre as multas anistiadas, nos últimos cinco anos.

Sob esse aspecto, quanto antes os contribuintes ajuizarem sua pretensão, melhor.

Ademais, o julgamento servirá de paradigma para se discutir outros parcelamentos e programas de remissão, haja vista que edições posteriores do Refis têm a mesma metodologia de cálculo, também prevendo a cobrança de juros sobre a multa de ofício anistiada. Segundo cálculos da PGFN, alardeando, em tom apocalíptico, seus já desgastados e pouco críveis (sem qualquer perícia!) argumentos consequencialistas, somente para o Programa Especial de Regularização Tributária (Pert), de 2017, poderia haver um impacto de pouco mais de 3 bilhões de reais em débitos repetíveis.

 

Fonte: Legislação & Mercados