A discussão relativa à tomada de créditos de PIS e Cofins sobre despesas com a pandemia de Covid-19 começou a chegar no judiciário. Recentemente foi noticiado que duas decisões de primeiro grau, proferidas no âmbito do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF1), indeferiram o pleito dos contribuintes que pretendiam ver essas despesas caracterizadas como insumos.
A sistemática não cumulativa das contribuições para o PIS/Pasep e da Cofins está prevista, respectivamente, nas Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003. Estas trazem, em seus arts. 3ºs, incisos II, a possibilidade da tomada de créditos sobre “bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes”.
Em 2018, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o REsp 1.221.170/PR, decidiu que a determinação das despesas que se enquadram como insumos deve ser aferida à luz da sua essencialidade ou relevância para o processo produtivo do contribuinte. De lá para cá, várias companhias têm recorrido ao Judiciário, dada a particularidade envolvida na análise de cada dispêndio.
A mais recente controvérsia se assenta na possibilidade de enquadramento das despesas com a pandemia de Covid-19, como os gastos com dispensadores de álcool em gel, disponibilização de máscaras, luvas, óculos e procedimentos de limpeza mais minuciosos, no conceito de insumos. As decisões mais recentes, consoante noticiado, não atenderam aos interesse dos contribuintes.
Em uma das decisões, proferida pelo juízo da 3ª Vara Federal de Sorocaba, a juíza Sylvia Marlene de Castro Figueiredo entendeu que “o disposto na Leis nº 10.637/2002 e na Leis nº 10.833/2003 não pode ser interpretado extensivamente para assegurar ao autor o creditamento tal como pretendido, visto que as hipóteses de exclusão do crédito tributário devem ser interpretadas literalmente e restritivamente, não comportando interpretação extensiva, à luz do art. 111, I, do CTN”. Com esse argumento, julgou improcedente o pedido da autora, uma distribuidora de materiais elétricos.
Onofre Alves Batista Júnior, sócio conselheiro do CCA, crítica a interpretação que vem sendo conferida pelo Judiciário nesses casos: “[q]uando a não cumulatividade entrou em vigor em 2002/2003 a proposta era aumentar as alíquotas (em relação ao modelo cumulativo) e permitir uma ampla tomada de créditos. Porém, não é isso que está acontecendo. A despeito das alíquotas maiores, os contribuintes são sistematicamente impedidos de tomar créditos sobre produtos e serviços que são sim essenciais e relevantes para o seu negócio.”
Sobre a questão específica dos gastos com a Covid-19, o sócio lembra que a depender da atividade do contribuinte, pode haver imposição legal a determinar os gastos para o controle do vírus: “[o] que temos verificado no Judiciário é a adoção de um conceito muito restrito de processo produtivo, além da desconsideração do requisito da relevância, voltando a jurisprudência a trabalhar apenas com a essencialidade, o que não atende ao decidido no julgamento do REsp 1.221.170”.
Onofre lembra, ainda, que “a não cumulatividade não se trata de um benefício fiscal, pelo contrário reveste-se de uma técnica de tributação que exige, diversamente do que vem sendo decidido pelos Tribunais, uma interpretação extensiva, com a finalidade de se efetivar o princípio da neutralidade. É este princípio, decorrente da isonomia, que guia a não cumulatividade. Dessa forma, somente uma interpretação extensiva, que possibilite a tomada ampla de créditos, pode conferir efetividade à neutralidade”.