Recentemente, duas decisões da Seção Judiciária de São Paulo permitiram o desembaraço alfandegário sem a intermediação de despachante aduaneiro. Em síntese, a Justiça Federal autorizou a atuação direta das empresas Operadoras de Transporte Multimodal (OTMs) e das Comissárias de Despacho na liberação das mercadorias.
A primeira decisão trata-se de sentença da 24ª Vara Cível Federal de São Paulo, proferida no julgamento de mandado de segurança coletivo contra ato coator da União Federal e do Secretário da RFB, com pedido liminar para afastar a restrição da IN 1.273/2012 e aplicar o art. 33 da Lei 9.611/1991, visando garantir que as OTMs possam representar o importador e o exportador nas operações de comércio exterior. As OTMs executam todos os serviços de comércio exterior, transportando a mercadoria do exportador até o importador (operações door-to-door), mediante contratação de serviços, dentre os quais a consolidação e a desconsolidação das cargas.
Apesar o art. 33 da Lei 9.611/1991, regulado pelo art. 9º do Decreto 3.411/2000, permitir que as OTMs sejam designadas como representantes do importador e do exportador no despacho aduaneiro relativamente às cargas sob sua responsabilidade, tanto de mercadorias importadas quanto exportadas, a RFB restringe a representação dos importadores e exportadores no despacho aduaneiro aos despachantes aduaneiros ou aos prepostos/dirigentes do importador/exportador, conforme o art. 2º da IN 1.273/2012. Ademais, conforme relatado pela autora, os mecanismos técnicos do Siscomex, limitam a atividade dos OTMs enquanto representantes legalmente autorizados de seus clientes.
Em sede de manifestação, a União apontou, em síntese, que o vocábulo “pode” do art. 33 da Lei 9.611/1991 permite a discricionaridade da administração pública para que autorize ou não que as OTMs atuem como representantes do exportador/importador. Já o Secretário da RFB arguiu que o órgão está em um contexto de contenção de despesas e que a habilitação dos OTMs no Siscomex necessita de atividades que demandam recursos temporais e financeiros que, no momento, são escassos.
O juízo da 24ª Vara Cível Federal de São Paulo destacou que a necessidade de ser portador de CPF (pessoa física) para habilitação no Siscomex representa um impedimento à participação das OTMs (portadoras de CNPJ) nos atos de desembaraço aduaneiro. Cita também que o Acordo de Facilitação do Comércio (Decreto 9.326/2018) busca eliminar o emprego obrigatório de despachantes aduaneiros. Com isso, conclui que a atuação direta de OTMs permite maior eficiência tanto na operação de importação/exportação e quanto no controle alfandegário.
Por fim, o magistrado concedeu a segurança à autora para condenar a autoridade impetrada a adotar as providências que assegurem a livre participação das OTMs n
o desembaraço aduaneiro. Desse modo, a RFB deve realizar os atos necessários para inclusão das OTMs em seus sistemas informatizados, habilitando-as a atuar no despacho aduaneiro em relação às cargas acobertadas por contratos de transporte multimodal.
A segunda decisão acima mencionada trata-se de decisão interlocutória recentemente proferida pela 11ª Vara Cível Federal de São Paulo em cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública, a qual também permitiu a liberação de mercadorias sem despachante aduaneiro. A ação em questão tem por objeto a obrigação da União em possibilitar às comissarias de despacho, que preencham os requisitos estabelecidos na legislação, o exercício de suas atividades perante as autoridades alfandegárias, diretamente e em nome próprio. As comissárias de despacho são responsáveis por facilitar a documentação e os trâmites que envolvem exportações e importações. A magistrada, nesse caso, decidiu que a União tem a obrigação de criar o perfil de comissário de despacho no Siscomex.
De acordo com nosso sócio fundador, Paulo Coimbra, as decisões da justiça federal de São Paulo caminham no sentido da simplificação e desburocratização do controle alfandegário: “Essas decisões estão em conformidade com o Acordo de Facilitação do Comércio, que expressamente elimina o emprego obrigatório de despachantes aduaneiros para garantir maior eficiência e racionalidade para as operações que envolvam outros intervenientes aduaneiros que possam ser legalmente habilitados a representar importadores e exportadores no desembaraço alfandegário. Os atos da RFB que restringem essa atividade aos despachantes são um verdadeiro atraso, uma arbitrariedade que traz inúmeros efeitos negativos e prejuízos para empresas que atuam no comércio exterior, criando verdadeiro impedimento para o exercício de atividade lícita.”
O Direito Aduaneiro é uma seara que atrai grandes esforços do CCBA. Recentemente, nosso sócio Pedro Henrique Alves Mineiro coordenou, junto à gestão da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/MG, a obra “O Atual Direito Aduaneiro”, que contou com a participam dos sócios Onofre Alves Batista e Marianne Baker.
O CCBA é também um dos parceiros do “I Seminário de Direito Tributário Aduaneiro”, promovido pela Universidade Federal de Minas Gerais. O evento é resultado das discussões empreendidas na Pós-Graduação da UFMG. Os encontros serão abertos a todos os interessados no tema, de forma gratuita, e o primeiro será dia 07 de março, das 9h00 às 12h15, conforme programação que pode ser conferida aqui. Inscreva-se!