A Primeira Instância do Tribunal de Justiça de São Paulo deferiu a suspensão da exigibilidade do Diferencial de Alíquota do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS-Difal) exigido pelo Estado paulista. A decisão foi proferida pela 8ª Vara de Fazenda Pública do TJSP e versa sobre a recente LC 190/2022, que regulamenta a cobrança do ICMS nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto.
O art. 3º da LC 190/2022 especifica que o início da produção de efeitos ocorrerá conforme o que determina alínea “c” do inciso III do caput do art. 150 da CRFB/1988. Esse dispositivo trata do prazo de 90 dias para início da vigência de lei que institui ou aumenta a cobrança de tributos. O dispositivo constitucional faz referência à anterioridade anual, que veda a cobrança de tributo no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou.
A interpretação que tem sido dada ao art. 3º da LC 190/2022 pelos Estados e pelo Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) é de que a lei passará a valer a partir de 90 dias após a sua publicação, o que corresponderia a 06/04/2022. O entendimento é de que a cobrança do Difal com base na nova lei deve respeitar apenas a noventena, prevista pelo art. 150, III, “c”, da CRFB/1988. O Confaz, por sua vez, publicou o Convênio ICMS 236/2021 no dia 06/02/2022, autorizando os Estados a cobrarem imediatamente o Difal.
Nesse contexto, o contribuinte impetrou mandado de segurança com pedido liminar contra a Secretaria da Fazenda de São Paulo. A empresa requereu medida liminar para determinar a imediata suspensão da exigibilidade dos valores referentes ao Difal/ICMS, tanto na esfera administrativa quanto judicial, pelo Estado de São Paulo. Ainda requereu a garantia de emissão de certidão de regularidade fiscal e o afastamento de quaisquer sanções decorrentes do não recolhimento do Difal/ICMS, como o impedimento do trânsito de mercadorias ou sua apreensão pela fiscalização.
Inicialmente, o juízo da 8ª Vara de Fazenda Pública do TJSP apontou que o STF, no bojo do RE 1287019, leading case do Tema 1093, decidiu que convenio estadual não pode suprir a ausência de lei complementar para o estabelecimento de normas gerais relativas à cobrança do diferencial de alíquota ao ICMS. Na oportunidade, o STF declarou a inconstitucionalidade de cláusulas do Convênio ICMS 93/2015 e a invalidade do ICMS-Difal ali estabelecido. Ainda, fixou a seguinte tese de repercussão geral: “A cobrança do diferencial de alíquota alusivo ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais”.
Assim, observando-se a modulação de efeitos do RE 1287019 e a edição da recente LC 190/2022, noticiada pelo CCBA, o juízo da Primeira Instância deferiu medida liminar para suspender a exigibilidade do ICMS-Difal exigido pelo Estado de São Paulo. O magistrado também afastou quaisquer sanções, penalidades, restrições ou limitações de direitos em razão do não recolhimento do Difal.
De acordo com nossa sócia, Alice Jorge: “[a] posição da administração tributária pela mera observância à noventena ou a cobrança imediata do ICMS-Difal é juridicamente equivocada. A LC 190/2022 criou normas gerais para uma nova sistemática de tributação. Por isso, é de se concluir que houve inovação material em todos os aspectos da norma tributária do diferencial de alíquota, o que foi reconhecido pelo próprio STF quando da análise do tema. Nesse cenário, há argumentos contundentes para sustentar que o Difal do ICMS deve ser cobrado somente a partir de janeiro de 2023, tendo em vista que a Lei Complementar foi sancionada e publicada já em 2022. Entendemos que a cobrança do diferencial em momento anterior, sem observar a anterioridade anual ou nonagesimal, é indevida.”
Alice ressalta que a decisão da Primeira Instância é um indicativo de esperança de que o Judiciário se atente ao princípio constitucional da anterioridade frente à edição da LC 190/2022: “A decisão favorável ao contribuinte na 8ª Vara de Fazenda Pública do TJSP é sinal de que pode ser que a jurisprudência suspenda a exigibilidade do ICMS-Difal, em respeito à anterioridade. Esse entendimento ganha ainda mais força ao considerarmos que a cobrança do diferencial de alíquotas do ICMS demanda a existência de lei ordinária dos Estados, que é o mecanismo por meio do qual a competência tributária deve ser exercida. Assim, nos casos em que já houver lei estadual a respeito do tema, a sua validade é condicionada ao início da vigência da lei complementar pertinente, conforme entendimento do STF. Nos casos em que não houver lei estadual editada antes do início do ano de 2022, fica ainda mais claro que o ICMS-Difal somente deve ser exigido a partir de 2023.”
Em atenção à urgência do tema, o CCBA irá promover um webinar para discutir a constitucionalidade da cobrança do ICMS-Difal e os reflexos causados pela LC 190/2022. A necessária judicialização da matéria e as melhores estratégias serão abordadas e discutidas com os participantes. O evento ocorrerá no dia 18/01 e será transmitido em nosso canal do YouTube. Inscreva-se!