Em recente decisão, a Justiça Federal do Estado de São Paulo concedeu a um contribuinte que atua no comércio exterior o direito de não incluir na base de cálculo do Imposto de Importação (II) as despesas com capatazia (despesas com descarga, manuseio e conferência de mercadorias em portos e aeroportos).

A sentença proferida pelo juízo da 17ª Vara Cível Federal modulou os efeitos da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Tema Repetitivo 1.014 (REsp 1.799.306/RS, REsp 1.799.308/SC e REsp 1.799.309/PR), julgado em março de 2020, na qual a Corte Superior entendeu que a capatazia faz parte do valor aduaneiro. A decisão do STJ divergiu de decisões anteriores proferidas pelo próprio Tribunal, como no AREsp 1.249.528/RS. Por isso, a decisão da justiça paulista afastou a tributação sobre a capatazia para períodos anteriores à data do julgamento do recurso repetitivo.

Para a juíza Ana Lúcia Petri Betto, diante de uma relevante mudança na jurisprudência dos Tribunais Superiores, pode haver a necessidade de modulação dos efeitos da decisão para garantir os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia sobre eventos de interesse social relevantes. Para ela “não há como negar que, até a data do aludido julgamento [repetitivo], a parte autora tinha a legítima expectativa de obter provimento favorável ao seu pleito, amparada por precedentes de ambas as Turmas do STJ, acompanhadas pela remansosa jurisprudência dos Tribunais Regionais Federais”.

Diante da ausência de modulação dos efeitos pelo STJ no julgamento do Tema Repetitivo 1.014, a magistrada entendeu, com base no §§ 3º e 4º do art. 927 do Código de Processo Civil (CPC), ser possível que um juiz de primeiro grau module os efeitos de decisão, de forma a privilegiar a segurança jurídica.

Para José Henrique Guaracy, sócio da área de contencioso do CCA, questões referentes a base de cálculo dos chamados tributos aduaneiros despertam muita controvérsia na jurisprudência, principalmente quando se considera as disposições do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), do qual o Brasil é signatário, e as previsões próprias da legislação sobre comércio exterior brasileira. “Os dispositivos do GATT e da legislação nacional às vezes são conflitantes, cabendo ao Judiciário dar a última palavra sobre a aplicação da norma”.

De acordo com nosso sócio, a discussão sobre a inclusão da capatazia no valor aduaneiro é antiga nos tribunais e por isso a decisão proferida pelo Justiça Federal de São Paulo é importante no sentido de trazer segurança jurídica para os contribuintes, uma vez que houve alteração de entendimento do próprio STJ. “A decisão proferida é um precedente de significativa relevância para que outros contribuintes que se encontrem na mesma situação possam também ver excluídas as despesas com capatazia do valor aduaneiro, base de cálculo do Imposto de Importação, no período anterior à mudança de entendimento do STJ”.

Guaracy lembra ainda que a definição sobre a inclusão das despesas com capatazia no valor aduaneiro impacta também a base de cálculo de outros tributos incidentes sobre produtos importados, como o IPI, o PIS-Importação, a Cofins-Importação e o ICMS. Consequentemente, a repercussão para as empresas pode ser de valor considerável.