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A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que a discussão relativa à inclusão dos serviços de capatazia no cálculo do valor aduaneiro é matéria infraconstitucional, não tendo reconhecido a existência de repercussão geral em relação à matéria tratada no Tema nº 1151 (leading case: Agravo em Recurso Extraordinário nº 1.321.554). Segundo o relator, ministro Luiz Fux, a controvérsia foi solucionada com amparo na legislação infraconstitucional e eventual ofensa à Constituição seria meramente reflexa.

A capatazia é atividade que compreende a movimentação de mercadorias nas instalações de portos e aeroportos, abrangendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelho portuário.

Já o valor aduaneiro é base de cálculo de tributos incidentes nas operações de importação, como o Imposto de Importação, o IPI, a contribuição por PIS-Importação e a Cofins-Importação. Desde 2003, a Receita Federal entende que “os gastos relativos à descarga da mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional serão incluídos no valor aduaneiro, independentemente da responsabilidade pelo ônus financeiro e da denominação adotada” (artigo 4º, §3º, da Instrução Normativa SRF n° 327/2003).

O contribuinte havia recorrido do acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que tinha como principal fundamento a decisão prolatada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do Tema Repetitivo nº 1014. Nesse julgamento, o STJ firmou o entendimento de que as despesas relativas à capatazia compõem o valor aduaneiro, reconhecendo a legalidade da Instrução Normativa SRF n° 327/2003.

Nas razões do Recurso Extraordinário, o contribuinte alegou ser inconstitucional a alteração da base de cálculo de imposto por instrução normativa, por violar o Princípio da Legalidade (art. 5º, inciso II c/c art. 150 da CRFB/88). Asseverou que o valor aduaneiro deve ser apurado conforme as normas do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio (AVA-GATT) que, por sua vez, não incluiu as despesas com capatazia no conceito de valor aduaneiro. Afirmou ainda que o AVA-GATT foi recepcionado e possui paridade normativa com a legislação ordinária, devendo ser observado para qualquer norma superveniente, conforme se extrai do art. 88 do CTN c/c arts. 49, inciso I; e 84, inciso VIII, da Constituição.

A sócia do CCA, Marina Marinho, lembra que “o reconhecimento de inexistência de matéria constitucional no Tema nº 1151 corresponde ao entendimento exarado pelo STF em julgados recentes, como no julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário nº 1.298.840, finalizado em março deste ano”. Acrescenta que, com o resultado desse julgamento, prevalece a decisão do STJ no Tema Repetitivo nº 1014, segundo a qual a capatazia compõe o valor aduaneiro.

Para Marina, porém, cabia uma análise pelo STF da perspectiva constitucional: “indubitavelmente, a controvérsia envolve o princípio da legalidade, que é um princípio constitucional. Ao considerar a capatazia como componente do valor aduaneiro, a RFB ultrapassou a sua competência regulamentar, invadindo a competência do legislador ordinário, que é o legitimado constitucional para definir a base de cálculo de tributos”.