Em 14/05, o Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento do RE nº 1.003.758, leading case do Tema nº 705 da Repercussão Geral, em que se discutiu o direito do contribuinte compensar o valor do ICMS devido pela prestações de serviço de comunicação, quando houver inadimplência absoluta dos respectivos usuários. Por 9 votos a 2, a Corte entendeu que a inadimplência do consumidor final não afasta a incidência ou a exigibilidade do ICMS sobre serviços de telecomunicação.
O recurso havia sido interposto pela Global Village Telecom (GVT), sob os argumentos de que, em caso de inadimplência absoluta do consumidor: (i) não ocorre o fato gerador do ICMS, pois o negócio jurídico não é aperfeiçoado; (ii) o crédito tributário possui natureza confiscatória e viola a capacidade contributiva, uma vez que é cobrado sem a correspondente manifestação de riqueza; e (iii) viola-se a não cumulatividade, pois a empresa tem direito a repassar o ônus ao contribuinte de fato.
O relator, ministro Marco Aurélio, acompanhado pelo ministro Edson Fachin, votou por dar provimento ao recurso extraordinário e propôs a seguinte tese de repercussão geral: “[é] direito do contribuinte aproveitar valores recolhidos a título de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, em relação a operações alusivas à prestação de serviço de comunicação, quando ocorrida inadimplência do usuário.” Nos termos de seu voto, se não há a contraprestação por parte do usuário, o negócio jurídico não é aperfeiçoado e, consequentemente, não é concretizada a hipótese de incidência do tributo.
O ministro Alexandre de Moraes instaurou a divergência, votando por negar provimento ao recurso. Para o ministro, a discussão sob análise assemelha-se à matéria julgada no Tema nº 87 da Repercussão Geral, no qual se fixou a tese de que “[a]s vendas inadimplidas não podem ser excluídas da base de cálculo da contribuição ao PIS e da Cofins, visto que integram a receita da pessoa jurídica”. Ressalta que a inadimplência do consumidor final seria um evento posterior e alheio ao fato gerador do imposto. Assim, mesmo com o inadimplemento, a prestação de serviço é onerosa, cabendo ao fornecedor recorrer às vias adequadas para a satisfação do seu crédito. Afirma que, caso o Supremo julgasse a ação em sentido contrário, estaria atuando como legislador positivo, ao conferir benefício fiscal não previsto em lei. A divergência foi acompanhada pelos ministros Nunes Marques, Dias Toffoli, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Roberto Barroso.
Para Paulo Coimbra, sócio fundador do CCA, a decisão deixou de considerar a própria estrutura da tributação plurifásica do consumo que, por disposição constitucional, é não cumulativa, ou seja, transfere o ônus da tributação para o consumidor final. “Tributar receitas inadimplidas é fazer com que a tributação atinja receita fictícia, sabidamente inexistente. No caso do ICMS, mais gravoso ainda, já que a capacidade contributiva é do consumidor final, sendo o agente econômico mero repassador. O ônus da tributação não deve recair sobre o contribuinte de direito, por expressa previsão constitucional. A decisão do Supremo Tribunal Federal, com todas as vênias que o julgamento merece, é míope, por ignorar que os tributos plurifásicos que oneram o consumo são, por exigência constitucional, não cumulativos.”.