Em 03 de agosto de 2022, o Congresso Nacional aprovou o Projeto de Lei de Conversão da Medida Provisória n. 1.108/22, o qual visa a regulamentação do teletrabalho, com modificações na Lei n. 6.321/76 e na CLT, além da alteração nas regras sobre o auxílio-alimentação, especialmente relativas a Programas de Alimentação do Trabalhador (PAT). O texto do projeto de lei de conversão segue para sanção presidencial.

No tocante à regulamentação do teletrabalho, ensejou debates a previsão da possibilidade de acordos individuais autônomos entre empregado e patrão sobre regras do teletrabalho. Dois partidos primavam pela negociação coletiva envolvendo os sindicatos como regra, mas a proposição foi derrotada na votação. Além disso, o relator do projeto na Câmara, deputado Paulinho da Força (Solidariedade/SP), adicionou ao texto do projeto a obrigatoriedade do repasse de saldos residuais decorrentes de contribuições sindicais às centrais dos sindicatos.

Segundo o texto aprovado no Congresso Nacional, teletrabalho é conceituado como “a prestação de serviços fora das dependências do empregador, de maneira preponderante ou não, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação, que, por sua natureza, não configure trabalho externo”, sendo que tal modalidade de prestação de serviço deve estar expressa no contrato individual de trabalho. Dentre as principais proposições legislativas do trabalho remoto estão: (i) prestação de serviço por produção de tarefa, estando os empregadores dispensados de controlar o número de horas trabalhadas; (ii) o empregado que tenha sido admitido no Brasil mas que permaneça em solo estrangeiro estará sujeito à legislação brasileira; (iii) prioridade de trabalho remoto para pessoas com deficiência, com filhos ou crianças sob guarda judicial até os quatro anos de idade; e (iv) que o regime remoto também poderá ser aplicado a estagiários e aprendizes.

No que diz respeito ao auxílio-alimentação, o projeto de lei versa que, em suma, ao empregador, na condição de contratante de pessoa jurídica destinada à distribuição do benefício do PAT, está vedado exigir ou receber deságio ou descontos de qualquer espécie e valor, prazos ou pagamentos que descaracterizem a origem pré-paga do benefício, bem como proventos de que não estejam vinculados a promoção de saúde e alimentação. Vale ressaltar que esta regra não se aplica aos contratos de fornecimento do auxílio ainda vigentes, até seu encerramento ou até decorrido o prazo de quatorze meses contados da data de publicação da lei.

Ademais, há previsão para aplicação de multa entre R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) no caso de desvirtuamento das finalidades dos programas de alimentação do trabalhador pelas pessoas jurídicas beneficiárias ou empresas registradas junto ao Ministério do Trabalho, além do cancelamento da inscrição ou registro de vinculação aos programas públicos de alimentação do trabalhador, com perda do incentivo fiscal.

Conforme noticiado anteriormente pelo CCBA, ainda este ano, a MP já previa novos requisitos para que o empregador deduza do Imposto sobre a Renda das Pessoa Jurídicas (IRPJ) e do adicional deste tributo os gastos dispendidos na realização destes programas: somente poderão ser objeto desta dedução as despesas referentes ao “pagamento de refeições em restaurantes e estabelecimentos similares e [à] aquisição de gêneros alimentícios em estabelecimentos comerciais”.  Em outra notícia, o CCBA também reiterou que o Governo Federal já havia tentado impor restrições à dedução elencada na Lei n. 6.321/1976, através do Decreto n. 10.854/2021, especialmente no art. 175.

Nesse sentido, o PLV manteve os requisitos de dedução supramencionados, constando no art. 5º do referido projeto, de forma a alterar a lei nº 6.321, em seu art. 1º, §3º. Da mesma forma, o art. 175 do Decreto nº 10.854/2021 também está presente no Projeto de lei de conversão, especificamente no art. 3º.

Além disso, o deputado relator pretendeu acrescentar ao texto autorização para que o auxílio-alimentação fosse pago em espécie ou por meio de depósito em conta dos trabalhadores. Em oposição, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) emitiu nota ressaltando a periculosidade dessa mudança, que poderia acarretar uma severa crise financeira a estes estabelecimentos, bem como poderia tornar dificílimo o controle de uso do benefício para sua finalidade precípua – assegurar o direito à alimentação de qualidade. Após os debates ocorridos na Câmara, o texto foi aprovado sem a possibilidade de pagamento de auxílio-alimentação em pecúnia, mas acrescentou, como contramedida, a previsão de que o saldo não utilizado ao final de 60 dias poderá ser sacado pelo trabalhador.

Nosso sócio, Guilherme Bagno, em análise ao Projeto de Lei de Conversão da MP n. 1108, ressalta que, “o projeto tem grande importância e atualidade por tratar da regulamentação do teletrabalho, em virtude da expoente utilização dessa modalidade, imposta pela situação de calamidade vivenciada em decorrência da pandemia causada pela Covid-19”.

Reitera, contudo, sua posição de que “a vedação da MP, mantida pelo texto de sua conversão, no que se refere aos deságios e descontos sobre os valores contratados nos programas do PAT, bem como a proibição de negociações de proventos diretos ou indiretos que não tenham relação com a alimentação do trabalhador geram um desincentivo para que as empresas se unam ao Estado para o cumprimento do auxílio-alimentação, na medida em que limitam o benefício fiscal. A redação conferida aos dispositivos sobre as multas abre margem para possíveis exageros de aplicação. Isso decorre principalmente dos termos e conceitos indeterminados e amplos os quais são empregados. Expressões como ‘execução inadequada, desvio ou desvirtuamento das finalidades do auxílio-alimentação’ podem ser interpretados de maneiras diversas pela fiscalização, o que pode gerar inclusive violações ao princípio da isonomia.”

Por fim, ressalta que, “apesar disso, houve um ganho social em se tratando da possibilidade de devolução do saldo não utilizado após 60 dias, na medida em que viabiliza que o benefício seja usufruído pelo empregado de maneira ampla, em acordo às necessidades individuais, ou seja, priorizando a liberdade e autonomia do indivíduo.”

O Coimbra, Chaves e Batista encontra-se à disposição para esclarecimentos e assessoria.