A CSLL dos agentes financeiros: o céu é o limite? Recentemente, por meio da MPV nº 1.034, de 1º de março de 2021, promoveu-se nova elevação da alíquota da CSLL devida pelas instituições financeiras, que foi para 25% sobre o lucro bancário.

Em artigo publicado hoje pelo Jota, os sócios do CCA, Paulo Coimbra e Onofre Batista, apresentam uma reflexão sobre o tema. A partir de qual ponto os princípios da isonomia e da vedação do confisco limitariam efetivamente a voracidade fiscal? Eles comentam que “O produto da arrecadação da CSLL, nos exatos termos da CRFB/1988, deve se destinar, necessariamente, à Seguridade Social (saúde, previdência e assistência social). Entretanto, no caso em tela, o aumento da tributação das instituições financeiras foi usado para compensar a redução da tributação do diesel e do GLP.”

“Como ressabido, esses aumentos na tributação dos bancos, sobretudo em momentos de severa crise econômica, oneram o custo do dinheiro tomado por aqueles que necessitam recorrer a empréstimos. Os efeitos econômicos, necessariamente, repercutem para aqueles que carecem de capacidade contributiva. A oneração dos bancos, assim, é discutível sob o ponto de vista econômico e criticável sob o ponto de vista constitucional”, acrescentam.

Confira abaixo um trecho:

 

O pensamento mais corriqueiro e raso vai no sentido de que o aumento exponencial dos tributos dos bancos é medida de justiça, que pode, ainda, resolver os problemas de caixa da Nação. Entretanto, essa irrefletida afirmativa, que pode até seduzir os tribunais, pode conduzir a graves equívocos.

A União tem a competência para instituir a Contribuição da Seguridade Social sobre o Lucro (CSLL), nos termos do art. 195, I, “c” da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988). Como bem aponta José Eduardo Soares de Melo, o LUCRO pressupõe o ganho realizado em atividades econômicas, abatidas as despesas.

Embora exista certa margem para qualificação do que seja LUCRO tributável no art. 195, I, “c”, da CRFB/1988, ao exercer sua competência, não pode a União determinar a tributação do que não constitua “acréscimo patrimonial” decorrente do exercício da atividade da empresa.

A alíquota da CSLL é de 9% para as pessoas jurídicas em geral e, nos termos do art. 3º da Lei 7.689/1988, para as instituições financeiras, a alíquota é diferenciada. Em 2008, a CSLL das instituições financeiras, por meio da Lei 11.727/2008, foi elevada para 15%, o que deu ensejo à Ação Direta de Inconstitucionalidade da Confederação Nacional do Sistema Financeiro. Por sua vez, a Lei 13.169/2015 aumentou a alíquota da CSLL devida pelas instituições financeiras de 15% para 20%.

Recentemente, por meio da MPV nº 1.034, de 1º de março de 2021, promoveu-se nova elevação da alíquota, que foi para 25% sobre o lucro bancário. Ao emparelhar à alíquota do IRPJ, a tributação da União alcança o patamar de 50%! Indesviáveis as indagações: até que ponto seria essa tributação discriminatória juridicamente tolerável? A partir de qual ponto os princípios da isonomia (ainda que em graus de eficácia mais tênues) e da vedação do confisco limitariam efetivamente a voracidade fiscal?

Aparentemente, o tributo pensado tão somente decota parcela do lucro dos bancos, abastece o Erário e não gera efeitos reflexos na economia. Entretanto, agradando ou não, todos os tributos que incidem sobre a pessoa jurídica, em alguma medida, repercutem a carga tributária para o consumidor (no caso, para o tomador do dinheiro). Obviamente, para compensar o aumento na tributação, os bancos precisam repassar para seus clientes seus custos, razão pela qual o aumento acaba por propiciar maiores taxas de juros e spread. O custo do dinheiro tomado dos bancos, inevitavelmente, fica assim mais caro; empreender no Brasil, que já não é nada fácil, fica mais difícil. Os efeitos para a economia são nefastos.

Nos termos da Exposição de Motivos 41/2021 do Ministério da Economia, a MPV 1.034/2021 veiculou “medidas de compensação das renúncias de receitas decorrentes da edição do Decreto nº 10.638, de 1º de março de 2021”, que reduziu a zero, temporariamente, o valor da PIS/Pasep e da Cofins incidente sobre o óleo diesel e, em definitivo, sobre o Gás Liquefeito de Petróleo destinado ao uso doméstico em botijões de até 13 kg. Para tanto, o art. 1º eleva em 5%, durante o segundo semestre de 2021, a alíquota da CSLL incidente sobre as instituições financeiras e equiparadas.

A partir de 1º de janeiro de 2022, as alíquotas devem retornar ao patamar atual. Trocando em miúdos, o Governo aumentou a tributação das instituições financeiras para subsidiar a retirada do tributo incidente sobre os combustíveis. Foi para atender a interesses políticos, tentando evitar o clamor decorrente de uma possível greve dos caminhoneiros, que a Presidência da República empurrou a conta para o setor financeiro.

Nesse compasso, a alíquota da CSLL devida pelos bancos, nesse período, saiu de 20% e chegou ao escorchante percentual de 25%, enquanto a  alíquota aplicável às seguradoras (seguros privados); de capitalização; distribuidoras de valores mobiliários; corretoras de câmbio e de valores mobiliários; sociedades de crédito, financiamento e investimentos; sociedades de crédito imobiliário; administradoras de cartão de crédito; sociedades de arrendamento mercantil; cooperativas de crédito e das associações de poupança e empréstimo, saltou de 15% para o patamar de 20%. Apenas com a majoração temporária das alíquotas, o Governo espera um aumento na arrecadação de R$ 2,27 bilhões para o ano de 2021.

O produto da arrecadação da CSLL, nos exatos termos da CRFB/1988, deve se destinar, necessariamente, à Seguridade Social (saúde, previdência e assistência social). Entretanto, no caso em tela, o aumento da tributação das instituições financeiras foi usado para compensar a redução da tributação do diesel e do GLP. Em nota à imprensa, a Secretaria-Geral da Presidência informou a motivação subjacente a essas medidas e detalhou que as desonerações devem chegar a R$ 3,67 bilhões (em 2021), a R$922,06 milhões (em 2022) e a R$ 945,11 milhões (em 2023).

Um tributo finalístico, que deve, inarredavelmente, ser destinado à Seguridade Social, é usado, declaradamente, para financiar a redução do preço dos combustíveis (por motivações políticas). Trata-se de uma verdadeira FRAUDE À CONSTITUIÇÃO, uma vez que o Executivo utiliza um tributo cuja receita deve ser destinada exclusivamente à Seguridade Social para finalidade diversa (em clamoroso “desvio de finalidade”).

Toda essa manobra tributária é inconstitucional. Ocorre, no caso, aquilo que Manuel Atienza e Ruiz Manero chamam de “ilícitos atípicos”, que devem ser afastados pelo Judiciário (fraude à lei; abuso do direito; desvio de finalidade). O pior é que essa política de redução do preço dos combustíveis (por 2 meses) financiada com o dinheiro da Seguridade Social sequer deve estancar o processo, porque essa escalada depende, sobretudo, do preço do dólar e do barril de petróleo.

Com esse aumento de 2021, somando-se a CSLL ao IRPJ, as instituições financeiras passam a ter, aproximadamente, 50% de seus lucros arrecadados (confiscados). Se a esse montante forem somadas as contribuições incidentes sobre o faturamento, IOF e encargos sociais, a tributação, indubitavelmente, ultrapassa o intolerável limite do CONFISCO. Uma tributação que absorva mais de 50% dos lucros, indubitavelmente, torna a União uma espécie de “sócio indesejado” e majoritário do empreendimento, que, compulsoriamente, abocanha a maior parcela dos ganhos, sem compartilhar qualquer dos riscos inerentes à atividade. É patente a ofensa ao princípio do não confisco.

 

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Fonte: JOTA